
Teresa e Helena Jané, são irmãs e artista plásticas que apostaram numa marca que não se define como sendo um estilo, mas é um conceito que abrange as várias vertentes da criação da cerâmica e não só. É acima de tudo uma visão pessoal que assenta nas mais diversas influências que as rodeiam e que transportam para as suas peças.
O que vós atraiu na cerâmica?
Helena Jané: Eu julgo que foi a sua plasticidade e as inúmeras possibilidades do material em si. Quanto a área estavámos muito familiarizadas, a nossa mãe foi professora de trabalhos manuais e de artes do fogo, desde muito cedo aprendemos a reconhecer trabalhos de grandes artistas e ceramistas portugueses, acompanhávamos à nossa mãe nesses estágios e era de facto uma área muito familiar. Fora isso, o nosso irmão, já em 1998, também tinha um projecto ligado à cerâmica, na vertente de azlejaria. Eu julgo que foi inúmeros factores, conhecendo o mercado, aquilo que se fazia e se desenvolvia por parte dos ceramistas e acompanhando o todo o processo de criação da nossa mãe, decidimos apostar em algo diferente.
O que define o estilo THJané?
HJ: Não é um estilo. Eu julgo que conseguimos construir uma identidade que não se encaixa nessa ideia, muito pelo contrário, quando iniciámos o projecto era um dado adquirido, até porque tínhamos diferentes formações, um conhecimento alargado e na nossa actividade profissional tocámos em muitas vertentes culturais extra THJané, isso fez com que um dos nossos grandes objectivos fosse diversificar, nunca encaixar, ou deixar-nos encaixar a nossa criatividade num determinado género e também por questões de motivação. Essa é talvez uma das razões que não nos leva a apresentar poucos elementos numa colecção. Trabalhámos vários materiais e temos um portfolio diverso que vai desde a pintura, a escultura até a cerâmica. Esse era também outro objectivo que era não nos fidelizar-nos, agarrar-nos a um estilo, mas acredito que estejamos a construir uma identidade. É o nosso paradigma.
Uma das vossas apostas são os acessórios, onde se inspiram para criar as colecções?
HJ: As jóias são uma das nossas vertentes mais ligadas à moda. As fontes de inspiração são muito diversas, nomeadamente para as grandes colecções que lançámos, a actualidade e as suas consequências na nossa própria vida pessoal e profissional. A natureza, uma conversa de café, uma discussão informal entre amigos poderá servir para nos lembrarmos de um determinado acessório. Eu julgo que basicamente é isso. Nós temos peças que são puramente decorativas, mas tentámos sempre que tragam alguma história, algum conceito por detrás dessa mesma peça. No início quando avançámos em 2004 com as jóias, os puxadores foram 2002, estavámos mais viradas para a natureza, para aspectos mais visuais do nosso quotidiano, ultimamente a nossa fonte de inspiração é muito ligada a nossa experiência, o dia-a-dia, a actualidade, as crises, as questões pessoais, a perda de entes queridos, tudo isso interfere muito e leva-nos a colecções muito mais conceptuais, com muito mais história do que inicialmente.
Então como é que se transpõem todas estas ideias para a cerâmica? Verifiquei que utilizam nas vossas peças materiais inusitados, como a corda, há uma certa influência de áfrica.
HJ: A questão dos objectos que nos rodeiam no nosso dia-a-dia, desde míúdas, desde sempre, não passam apenas pela cerâmica.Estão misturadas com outros trabalhos que vieram de África, que os nossos pais trouxeram de Angola, ou inspiradas durante o estágio que à minha mãe foi executando enquanto professora e por não virmos de uma família rica, não termos muitos recursos porque éramos quatro filhos e os nossos pais eram ambos funcionários públicos, nunca houve muito dinheiro, foi-nos sempre incutido tentar alcançar os nossos objectivos para suprir as nossas necessidades, por isso, estavámos habituados a fazer grandes malabarismos, a inventar coisas e ao mesmo tempo sermos pessoas muito práticas, acabámos por trazer isso tudo para o nosso projecto. Somos ceramistas sim, e estamos numa era de que gostámos, com uma criatividade brutal ao nível nacional e não só, enfiar-nos na tal prateleira de cerâmica e ter um certo preconceito com qualquer material, eu julgo que isso não vai ajudar a tornar-nos diferentes e trazer inovação ao mercado. A mistura de materiais é de facto importante, a sua orgânica é algo que nos preocupa, o entendermos que há determinados materiais que se dão melhor com a cerâmica, mais terra, que tem mais a ver com o que fazemos, por isso, optámos pelos tecidos, fios, alguns deles executámos, outros adquirimos, mas damos sempre um toque diferente, bordámos, trazemos sempre a inovação à peça, como foi o caso da borracha e da "Fisgay"em que todos ficaram todos na dúvida se seria um colar ou um objecto. Achei piada, porque no CCB(Centro Cultural de Bélem) foi exposto como sendo uma jóia e havia ali uma dúvida de interpretação por parte dos lojista e da gerência, mas julgo que deve haver essa preocupação. Até porque cerâmica numa jóia é limitante, precisámos sempre de um apoio para tornar a peça mais resistente, a colecção mais vestível e entendemos que é necessário aplicar ali outro género de materiais.
A Helena e a Teresa tem uma dialéctica, então como se conjugam essas ideias e pensamentos diferentes? Como é que funciona o vosso processo criativo?
HJ: Acontece o seguinte: uma de nós tem sempre uma ideia, nunca acontece ao mesmo tempo como deve calcular, imagina, a Teresa tem um ideia para uma peça com uma determinada área, muito antes da sua fisicalidade, pensámos em como lhe podemos atribuir um conceito, uma história, que forma terá, que materiais vamos aplicar e assim começa a funcionar essa parte da ideia, essa espontaniedade de dizer que tal fazermos isto? Começámos num despique uma com a outra, vai um bocado a desgarrada, como uma peça que criamos há pouco tempo, numa tentativa de passarmos da ideia para a acção, depois logo se vê quem é que vai fazer o quê. Mas, eu julgo que tentámos chegar a um consenso, através de um ponto de partida que será a Teresa ou eu. É uma grande necessidade, não tendo um terceiro elemento connosco para desempatar determinadas discussões, desde o inicio que temos uma grande preocupação de termos ideias diferentes e quando chegámos ao fim do processo mesmo que seja uma peça pensada e criada pela Teresa há sempre algo de mim, nem que seja o texto, ou os acessórios em torno dela, o consenso é sempre necessário. Nesta altura, depois de vários anos de trabalho já estámos muito mais serenas, mais pró da ideia uma da outra e tentámos ajudar-nos em vários aspectos, porque há essa urgência de lançar o produto no mercado e por isso tentámos com a maior brevidade resolver alguns dessacertos que vão surgindo ao longo do processo.
Como é que o mercado olha para duas ceramistas portuguesas? Há uma aceitação por parte do público em geral ou não?
HJ: Há, desde os primeiros anos que trabalhámos para o mercado nacional, sempre apostámos forte neste nicho, não é só connosco, é para todos os profissionais. Trata-se de uma área muito acarinhada pelo público, porque existem muitos ceramistas portugueses fabulosos, e não falo só de Bordalo Pinheiro, os mais contemporâneos desta área tem um nível elevado de qualidade e daí termos apostado neste mercado com novos produtos. A pouco perguntou-me pelas jóias, elas surgiram como uma complementaridade ao nosso trabalho, desde o início que trabalhámos em puxadores originais, porque verificámos que havia uma lacuna no mercado, mesmo quando é sazonal, os portugueses gostam de oferecer este tipo de peça no natal, na páscoa e aniversários, apreciam sobretudo apostar pela diferença, na procura de algo inovador em termos de cerâmica.
Qual é o próximo passo para a THJané? Em termos de um futuro próximo o que pretendem na vossa marca?
HJ: Eu julgo que é o que estamos a fazer actualmente, a tentativa de voltar ao início, é tentar alargar os nossos tempos de trabalhos, que consideramos como sendo as nossas pausas. O ano passado fizemos uma exposição que intitulámos de "pausas" que foram os tempos de trabalho e de criação técnica de peças. Um artista actualmente perde-se numa série de questões, desde o marketing, ao aspecto do site, os textos, etc que são importantes, mas que nos retiram tempos de criação, que é disso que a THJané vive. Há dois, três anos apresentávamos colecções a um ritmo alucinante, depois passados quatro anos começámos a apresentar apenas duas e ultimamente é só uma, porque é terrível estar presa a uma série de questões, de apresentação do produto, do tipo de embalagem e de como os vamos êxpor. Estes aspectos levaram-nos a procurar parceiros capazes, para trabalhar num projecto com já doze anos e que tem como objectivo manter a inovação e os níveis de qualidade muito elevados. Os nossos puxadores puseram-nos numa fasquia elevadíssima, saem em revistas estrangeiras como objectos de cerâmicas fabulosas, e de facto para manter esses níveis necessitámos de parceiros, para deixar espaço à criação e simplificar alguns procedimentos, o que não é fácil. O nosso objectivo é voltar atrás e podermos criar peças com tempo e poder posicioná-los adequadamente no mercado nacional e internacional.