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A narradora de histórias

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Dizem que à arte nada mais é do que traços e sombras que fazem sobressair o volume. Esta é uma definição perfeita para os trabalhos da artista plástica Guareta Coromoto que desafiam o nosso olhar com o seu constante movimento perpetuado pelas cores e pelas personagens que povoam as suas telas.

Noto que no seu trabalho existe o desenvolvimento constante da figura, quer humana, ou de animais. Porquê sente essa necessidade?

Guareta Coromoto: Eu penso que há coisas que vivem connosco. Muitas vezes num trabalho, mesmo que comece só com as cores, nós artistas temos muitas formas de começar, temos que ter um tema e de início seguimos sempre essa linha, mas quando dá-mos conta muitas vezes adoptámos outro caminho. O que acontece? Eu posso encetar pela cor, mas a partir daí eu começo a imaginar uma história e há sempre a figura humana, ou de animais. Crio uma história em torno daquele trabalho. Penso que isso acaba por existir em nós, em vir ter connosco. Esses personagens estão cá dentro.

São personagens do seu quotidiano, ou do seu imaginário?

GC: Do quotidiano e do imaginário. Muitas vezes vou buscar histórias que ouvia em miúda, outras que a minha mãe vai contando, algumas ancestrais. Insiro lendas, narrativas e contos, coisas que fazem parte do imaginário e outras que recrio.

Na sua pintura há um traço com cores muito fortes, essa componente é resultado das suas origens sul americanas ou da ilha?

GC: Quando comecei a trabalhar nas belas-artes a minha palete era mais neutra, já havia a figura humana, mas usava os verdes, os azuis, os ocres e as cinzas. Ao longo do tempo houve cores que começaram a sobressair e vir cá para fora. Comecei a usar o amarelo e começou a sobressair, depois o vermelho, o rosa e houve um dia em que decidi experimentar determinadas tonalidades que enchem a nossa alma. Agora não sei se é porque elas existem cá dentro, ou por ter nascido num país sul-americano, por muito que não vivamos lá muito tempo dizem que fica connosco. O facto é que eu gosto da música, dos ritmos.

As cores sublinham as histórias que conta na tela, em que medida?

GC: Ajudam, conferem-lhe mais magia, mais contraste. Eu até uso poucas, as mais obscuras tem mais luz, acabam por fazer sobressair mais as formas. Posso utilizar o preto como contraste para sublinhar mais a forma e uso a cor para fazer sobressair a luz e determinados volumes.

As telas têm muita energia e movimento. Isso é um reflexo da sua personalidade ou não?

GC: Isso tem a ver muito com a minha personalidade, embora eu sinto muitas vezes que tenho dois pólos opostos. Sou uma pessoa que pareço calma, se calhar é esse aspecto que as pessoas notam mais, mas sou alguém que não consigo estar parada. Durmo pouco, logo que acordo tenho que sair e andar, logo que sinto a casa em silêncio tenho que ir embora. Ninguém me põe a correr, mas gosto muito de andar e se calhar é esse movimento que tive sempre comigo, que tive que imprimir nas minhas telas. Desde sempre o movimento é uma constante no meu trabalho. E penso que tem muito ver com a minha personalidade e também com a minha formação. Andei em belas artes e o primeiro impacto que tive da vida artística foi um professor que precipitou o meu mote para a figura humana e o movimento, apesar que cada um nós ter impressas na sua essência determinadas características. Lembro-me que nas aulas tínhamos uma senhora já de uma certa idade que pousava para nós, que estava em cima de uma mesa e em constante movimento. Tivemos que aprender a desenha-la assim, o que era muito difícil para mim na altura com apenas dezoito anos, mas fiquei fascinada com esse corpo a movimentar-se, depois aquela mulher tinha as formas muito acentuadas fruto da idade. Isso ficou. Não continuei durante dois, a três anos nas belas artes, tive que reiniciar com outro tipo de conceitos, mas adorei. Depois mais tarde retomei esse processo.

Reparei que se expressa artisticamente através da pintura, mas também utiliza outros conteúdos, onde se sente mais à vontade?

GC: Normalmente através da pintura foi ao longo dos anos a que mais desenvolvi como técnica. Sempre gostei a escultura, a parte do volume. Nunca a exercitei muito porque não se consegue fazer tudo. É preciso um espaço, um ambiente e dominar determinadas técnicas. Sempre gostei de cerâmica, mas na altura erámos obrigados só a pintar e a não recorrer ao volume. Tudo isso ficou, o bichinho como dizem na Madeira. Ultimamente voltei a remexer na cerâmica, mexer nos volumes, nos materiais. Depois utilizo coisas que vou guardando, que ficam no atelier e gosto de usa-las como acessórios. Já não estou preocupada com a imagem. O cabide que fiz para a colecção de design da galeria da mouraria tem um colar que pode ser usado como suporte para outros.

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