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A nómada da terceira

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A “confeitaria da mala” e o “cut furniture” são dois conceitos de design completamente distintos que surgem da mente criativa da Mariana Costa e Silva, açoriana, que interpretam de forma muito particular e eficiente os objectos do nosso quotidiano.

Quando é que aparece a “confeitaria da mala”?

Mariana Costa e Silva: Aparece na primeira ladra alternativa, numa feira. Uma amiga convidou-me um mês do evento, eu já tinha há um ano a ideia de fazer malas de alcatifa e pensei: vai ser isto mesmo. Na oficina onde trabalhava, havia uma máquina de costura, eu trabalhava fora das horas de expediente. Comprei a alcatifa, que custou na altura cinco euros e foi ensaiando, cosendo e correu muito bem quando os apresentei na feira.

Porquê escolheste alcatifa como matéria-prima?

MCS: A alcatifa tem corpo, a mala mantém a forma, para além disso, não desfia nas bainhas e tem o factor económico apetecível, até agora não encontrei nenhum material com um preço tão acessível.

Reparei que há várias malas, em diversas cores e vários formatos.

MCS: Sim, sempre gostei muito de cor, desde o início que há tonalidades muito garridas.

As colecções propriamente ditas, estão associadas a uma ideia, ou por padrões?

MCS: Tenho interpretações livres sobre uma mala. Na minha formação como designer, tive muitos exercícios que serviam para transformar formas planares em tridimensionais, de maneira que era um tema onde me sentia bastante á vontade. Inicialmente comecei com formas muito redondas. Surgiam de ideias, ou interpretações de malas que já existiam, sempre como um modelo muito próprio, alguns deles são tão pouco convencionais que são difíceis de introduzir numa fabricação. Só recentemente as colecções começaram a ter temas, senti essa necessidade. O ano passado foi a horta e este ano é a cor, estou desenhar malas com várias cores, por exemplo, ter uma mala com vários tons e não apenas um. É um tema que vou lançar em Setembro.

Quem é a mulher que usa as tuas malas?

MCS: É gente nova, divertida.

Qual é das malas que desenhaste aquela que o teu público-alvo gostou mais?

MCS: É a avozinha, é a mala mais emblemática da minha colecção, inclusive já foi copiada, muito mal por sinal. Já fiz até uma versão maior, a bisavó, porque as pessoas diziam-me que a original era muito pequena.

Vamos agora abordar um outro conceito mais recente, o "cut furniture", que é mobiliário sem parafusos. Como é que surge esta ideia?

MCS: Curiosamente, comercialmente é mais recente, mas surgiu muito antes da confeitaria das malas. Foi uma ideia que comecei a ter desde cedo, sou açoriana e fui estudar para Lisboa. O meu quarto quase não estava mobilado, só tinha uma cama e um guarda-fato e um dia estava a passar pelos Chiado, ainda estava em obras e vi uma placa de contraplacado intacta, foi perguntar aos trabalhadores se eles me davam e eles disseram que sim. Fiz então uma mesinha de cabeceira sem parafusos, que pudesse levar debaixo do braço no comboio. Desenhei as pecinhas, cortei e foi só montar. No quinto ano, no projecto de final de curso, por nossa iniciativa, voltei a esta temática de fazer mobiliário em que o processo de maquinação era reduzido ao mínimo, ou seja, a peça era cortada e não era preciso mais nada para montar. Mais tarde, concorri a um concurso da Massimo Dutti, que pretendia design tendo em conta o espaço e eu achei que era uma oportunidade para dar o passo seguinte. A organização disponibilizava um pequeno orçamento para criar o protótipo. Comecei com três peças, um banco, uma mesa e uma estante, que não fazem parte da colecção actual. Dois anos mais tarde, no concurso das indústrias criativas da Fundação Serralves e da Unicer, transformei o mobiliário em ideia de negócio e ganhei o primeiro prémio. Tinha como compromisso iniciar a comercialização do mobiliário num espaço de tempo que abrangia os dois anos e assim fiz. Desenvolvi uma colecção mais coesa e mais comercial, retirei a estante e substitui por uma cadeirão e uma cadeira, o sistema de encaixe tornou-se mais sofisticado e participei, o ano passado, na minha primeira feira internacional de “life style” em Tóquio.

Qual foi o feedback?

MCS: Foi muito bom. Os japoneses apreciam muito o conceito de gadget e a "cut furniture" resultou muito, mas na verdade o mobiliário não funciona muito para eles, porque eles usam muito poucas peças. Foi interessante o contacto, porque verifiquei que como posso alterar o conceito para torna-lo mais interessante para o Japão, que é um mercado que gostava de abordar. Este ano participei na feira ambiente de Frankfurt com as duas colecções e correu muito bem. Funcionou como catalisador para novos projectos e foi bom nesse sentido. Estou muito interessada em desenvolver outras linhas de produto e a feira é muito frequentada por distribuidores com marca própria e fabricantes que me propuseram desenvolver linhas que resultam da experiência que ganhei com o meu mobiliário.

Mas, estas a vender a “cut furniture” ao nível nacional?

MCS: Sim, tenho um único posto de venda neste momento que se chama, “baseado no conceito store”, que fica no Príncipe Real, em Lisboa.

Mas, a cut tem um posicionamento diferente das malas, em termos de público.

MCS: Sim, eu dizia a brincar que a “confeitaria da mala” estava a concorrer com os chineses, porque elas sempre se posicionaram pelo preço. A “cut furniture” não. Há uma série de variáveis neste conceito, como sejam o material e mesmo a complexidade do processo de fabrico que faz com que o público-alvo seja médio alto, pessoas urbanas, com gosto pelo design.

É uma mobília para espaços mais exíguos?

MCS: Sim, o banco, por exemplo, pode ser montado rapidamente quando aparece mais uma pessoa para jantar. Montámos tudo em segundos. Elas são todas desmontáveis, são planas, dá para montar e desmontar as peças as vezes que quisermos, sem ferramenta nenhuma. A mobiliário que levo para as feiras é sempre o mesmo e ainda não sofreu qualquer fadiga no encaixe.

As peças que crias são inspiradas na ilha, nas tuas origens, ou não?

MCS: A minha inspiração vem do facto de ser nómada, os estudantes são assim. Passava uns meses em Lisboa, depois na páscoa e no verão ia para casa e num quarto alugado nunca te sentes em casa e também queria levar a mobília comigo e foi mais esse factor de me sentir nómada que me levou a criar estas peças, ser ilhéu é ser nómada, mas não me influenciou directamente.

www.confeitariadamala.com

www.cutfurniture.com

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