Desde 2011 que o Teatro Praga se dedica à Catequese. Em diferentes formatos e com diferentes temáticas este é sempre o espaço que quer ser um momento de reflexão, misto de intimidade dubitativa e pregação intolerante. Desta vez, na sua viagem pregatória, passa pela Porta 33 com André Teodósio e o escritor José Maria Vieira Mendes. Ambos ajudaram os participantes não a encontrar respostas mas a reformular as suas perguntas. Sobre teatro, por exemplo. Mas também literatura ou dança ou dicionários ou mortes e nascimentos e histórias e por aí fora.
Catequese porquê? É uma provocação?
André Teodósio: Não, achámos que é preciso partilhar alguma gramática para conseguirmos a nossa megalopsique ou a nossa transcendência de alma. É um posicionamento, uma saída do nosso agir quotidiano, como se nos víssemos ou tívessemos uma auto-consciência para podermos decidir o nosso futuro, ou o nosso caminho, portanto, o que tentámos fazer com esta catequese é sermos o homem e o nosso próprio deus ex-máquina ao mesmo tempo, estarmos a fazer qualquer coisa e estarmos a ver qualquer coisa. A catequese é uma espécie de uma conversão de outras maneiras de fazer, ou de outros tipos de percepção para a nossa maneira de experimentar uma determinada forma de consciência.
Uma dessas formas de consciência é o sublime. Explica essa ideia.
AT: É uma forma do estar a viver entre o real aquilo que não programamos e conhecemos e a realidade onde nos encontrámos diariamente. O sublime é esse posicionamento quase fantasioso, por exemplo, de viver junto ao real para sempre, ou viver somente na realidade, é a maneira que nos posicionámos nas várias contingências, ou tipos de modos de viver, ou de acontecer, de agir, ou de pensar, que coexistem em nós. É o não seguir só um caminho e não estar só num sítio, é conseguir dar um passo e saber que pode ser mortal ou não, é como a pintura do Caspar David Friedrich, do homem que esta na falésia, ele tem o real e tem a vida dele por detrás, se der um passo em frente morre, se for para atrás continua na sua vida, mas não tem aquela experiência estética do real, de uma beleza monstruosa. É justamente a manobra do sublime que tentámos fazer também.
Então como se passa da ideia, do conceito, para a práctica no workshop?
AT: O que estamos a fazer é duvidar do saber, do ser, de que somos alguma coisa, para a ideia de que estamos a ser muitas coisas ao mesmo tempo. Portanto, começou por esse primeiro passo, a atribuição do que o teatro é, atribuímos coisas ao ser e depois duvidamos do que o ser é alguma coisa e passámos a estar. Dentro deste estar sabemos que estamos em relação com muitas coisas as quais usámos para nós espelharmos ou usamos para espelhar. Este último passo é o espelhamento daquilo que nos apresentámos como sendo e através do olhar dos outros irmos manipulando os nossos corpos, ou as nossas maneiras de agir segundo aquilo que estamos a ser, mas modificando ao mesmo tempo para podermos ser mais qualquer outra coisa. É mesmo um processo do sublime, há uma coisa real do qual nos esquecemos, ou que vislumbrámos de vez em quando, porque vivemos na realidade e então falta o passo, o que desejamos ser na articulação destas duas coisas. É algo práctico, temos o texto, estamos em frente a um espelho e tentámos um exercício do movimento do corpo, da consciência, da maneira como nos podemos representar e ao mesmo tempo os outros estão a olhar para nós e vão-nos imitar a fazer qualquer coisa e nós também temos que imitar o que eles estão a fazer, é a nossa imitação. É um jogo de espelhamentos, é um desprendimento total dos restinhos ainda de ser e da maneira que somos até ficar nada.
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