
É a última exposição de Teresa Gonçalves Lobo cujo mote é um convite para olhar estes desenhos reencontrando o passeio das linhas, a dinâmica dos gestos, a orgânica das formas, as ideias que neles ficaram presas à matéria e também, para encontrar o vazio da página, o lugar onde nasceram as linhas, como descreve Isabel Santa Clara.
Uma das características da sua obra é o traço. E já referiu que sabe muitas vezes como começar uma obra, mas não tem ideia de como vai acabar.
Teresa Gonçalves Lobo: Eu quando começo uma obra não sei, não faço a mínima ideia, para onde o traço me leva. Estou num estado de espírito em que me apetece desenhar, isto significa para mim que estou com a cabeça liberta, que estou livre de pensamentos, de ideias para desenhar, isso é muito importante no meu caso e só posso falar por mim. Nunca parto para um desenho pensando que vou fazer isto, é claro que, quando tenho o impulso, a vontade e depois vou escolher os materais que vou utilizar. Tenho trabalhos com traços muito finos e isso significa que estou num estado de muita paz e pego, por exemplo, numa caneta com tinha da china e uso um papel muito fino, porque é essa leveza que me apetece e que demora muito tempo. Eu tenho registos de desenhos, que demoram uma eternidade, já me dei de conta de estar a riscar e de repente pensar: para, tens de inspirar. É quase como se não respirasse. É claro que quando faço estes desenhos não só tenho de estar num determinado estado de espirito, como num espaço sem ruído. Ás vezes perguntam-me se gosto de ouvir música, eu aprecio música, mas quando estou a desenhar normalmente não gosto dessas interferências, prefiro deixar o que esta cá dentro e não ser influênciada por outras coisas que vêm de fora. Depois tens outros registos mais fortes e aí apetece-me desenhar talvez com pastel e carvão e folhas com gramagem que aguente a força que eu quero lá colocar. E faço gravura, mas aí risco como se fosse um lápis de metal, possui uma força que o papel nunca aguentaria e fico exausta.
Como vem de uma ilha, é a ilha interior que se reflecte na sua forma de estar como artista?
TGL: Eu penso que tem toda razão quando faz esse comentário. A ilha esta aqui nos meus desenhos, já várias pessoas me disseram isso, no continente dizem-me que notam sou da ilha e acho isso interessante, porque é sinal que estou lá. É natural, porque ela esta comigo, embora não esteja a viver aqui, faz parte de mim. É naturalíssimo que se veja muito de ilha. Acredito que sim e gosto de saber isso. Mas, não parto para o desenho com essa preocupação de parecer ilha nos desenhos, não sou eu e deixo fluir.
Há três tons nesta exposição, que tipo de tonalidades queria mostrar aqui?
TGL: Eu nunca pretendo mostrar nada. Eu compro os materiais com os quais gosto de desenhar e desenho. Depois quando é para escolher os trabalhos para a exposição não tenho uma ideia fixa, vou buscar obras que façam sentido estarem juntas. Neste caso, vemos muitos desenhos a preto e desenho muito com esta cor, gosto mesmo muito e a razão desse sentimento é porque o preto não distrai. Vou dar um exemplo, se tiver uma paisagem com vários riscos de uma só cor, talvez vamo-nos concentrar naqueles riscos. Se pusermos esse mesmo desenho em várias cores, talvez vemos esse mesma paisagem mas com uma grande diversidade de tons, mas deixámos de ver o desenho. E acho que é por isso que gosto tanto de desenhar a preto. Mas, tenho desenhos à sépia que é uma cor que esta ali quase tímida. Tenho outros tons como o vermelho, sozinho, ou com fundo preto.
Gosta também do vermelho?
TGL: Sim, gosto. É uma cor distante que esta associada a tanta coisa. Mas, se eu acabo por ir buscá-la por algum motivo é, depois de ter desenhado tantas vezes a vermelho, eu própria começo a questionar-me, porquê é que gosto deste vermelho para desenhar? São coisas que quando estou a comprar o material não penso nisso, mas depois coloco essas questões a mim própria. Porquê fiz isto? Eu acho que só nos conhecemos a partir daquilo que fazemos. E não é qualquer vermelho de que gosto, é mais o vermelho vivo que eu adoro desenhar e simboliza tanta coisa boa, vida, sangue, mas também o amor.

A inspiração surge da natureza ou do seu dia-a-dia?
TGL: As pessoas também, mas sem dúvida que é a natureza. Somos uns seres que andámos por aqui, fazemos parte da natureza e isso inspira-me imenso. O mar, as plantas e o ceú.
O que é mais dicífil nesse processo criativo? Se é que há alguma etapa que é mais dura, ou nem por isso?
TGL: Eu olho tudo como sendo um processo natural. Às vezes o que é difícil é o que esta para além disto tudo, o conseguir manter-se vivo como artista, no sentido, de sobreviver, de emoldurar trabalhos, fazer exposições e criar catalogos. Desenhar é como respirar.
É constante?
TGL: Não, não. Eu não sinto essa necessidade. Eu desenho muito, ás vezes é preciso mandar-me parar, dou-me de conta e digo-me a mim mesma: calma! (risos). Mas, não acontece todos os dias, dígamos que não estou capaz de o fazer diariamente, porque há momentos em que sabemos que se nos vamos aproximar de um papel não vamos fazer nada bem.
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