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O lutador

Escrito por  yvette vieira fts célia do carmo

Luís Apolinário é um dos responsáveis pela Alambique, uma empresa que se dedica à distribuição de cinema estrangeiro independente e alternativo no nosso país e ainda, documentários nacionais. Um trabalho árduo que só é possível com uma grande paixão.

Possui uma distribuidora há 3 anos, é difícil faze-lo em Portugal?
Luís Apolinário: É cada vez mais difícil.

O público português está a ganhar gosto ao cinema nacional, ou ainda o encara com um certo preconceito?
LA: Essencialmente distribuímos cinema estrangeiro independente alternativo. Temos cinema português com orgulho. Um catálogo de documentários que são distribuídos maioritariamente por nós, como "Ruínas" do Manuel Mozos, ou "48" de Susana Sousa Dias, ou ainda "a cidade dos mortos" de Sérgio Tréfaut. De uma forma geral não encarámos dessa forma o cinema português, somos recentes e a maior parte dos realizadores e produtores já tinha distribuidores e não estamos aqui para roubar nada a ninguém, nem para entrar em lutas. Juntámos producções que mais bem vêm ter connosco do que o contrário, são produtores que tem um filme nas mãos e sentem que de alguma forma um distribuidor pode ajudar tendo algum conhecimento do mercado e como as coisas se fazem.


É mais fácil distribuir documentários? Em termos de visibilidade, existe um pequeno espaço para este tipo de audiovisual na RTP 2, do que por exemplo, para as curtas-metragens.
LA: O cinema está cada vez mais complicado, e aqui não quero personalizar, mas é apenas um espaço para filmes extraordinários, gostemos ou não, tem de ser muito fora do normal, o que é complicado nas curtas-metragens já que o seu papel é ser um lugar de descoberta, onde as pessoas podem aprender e não é para fazer uma obra-prima. Não é esse o objectivo de toda essa cadeia de produção e desse ponto de vista ninguém paga um bilhete para ir ao cinema ver uma curta-metragem. Os festivais acabam sendo esses locais de encontro tanto de quem faz filme, como quem os vê, o híper apaixonado em termos cinematográficos, que pouco o encontra nesta sociedade. É também fundamental ter espaços de difusão como as cadeias de televisão. Não é transformar uma coisa que é muito fraquinha, numa coisa genial, trata-se de um espaço de existência regular que de outra forma não se consegue.


E distribuir filmes de autor é ainda mais difícil?
LA: Cada vez mais. São as pessoas, estamos mais viciados no fast food do pensamento e de acção. Não tenho outra forma de dize-lo.

 

Também não passa muito pelo download ilegal de filmes?
LA: Passa muito por aí, mas que posso fazer?

 

Então, como é que uma pequena distribuidora pode sobreviver 3 anos?
LA: Olhe para já, onde outras pessoas têm 10 trabalhar, nós somos dois. Fazemos tudo, desde ir aos festivais comprar até fazer caixas de cartão para enviar à Fnac. É um acto voluntarioso, para se estar neste meio tem de haver paixão, ter um pouco menos de exigência pessoal.


Tendo a experiência destes 3 anos e olhando para o panorama actual e como tudo esta interligado, como vê o futuro?
LA: Esta tudo de facto interligado e a internet é um parafenómeno, posso dar a minha opinião pessoal mas conta pouco, estamos num mundo confuso, onde ninguém acredita naquilo que ouve e o cinema de autor desse ponto de vista, comparando com os outros fala das coisas e não do que parecem. Se me disser o que vai acontecer aos mercados financeiros, eu posso dizer o que vai acontecer ao cinema de autor, o mundo esta a discutir uma série de coisas que vão ter de ser recentradas.


Como?
LA: Distinguir o que é essencial do que é acessório. Não sei dizer, porque o cinema reflecte a sociedade e vice-versa. Vivemos num mundo em que ninguém sabe o que vai acontecer para o próximo ano.


Olha para a internet como algo que só o prejudica, mas também há o outro lado.
LA: A divulgação. O problema é muito complicado.


Há filmes que já se conseguem financiar desta forma.
LA: Isso não é verdade. É apenas de um ponto de vista amador. Não é possível ter o cinema que temos, nem as pessoas que temos que são funcionários altamente qualificados a trabalhar sem pagar. É impossível pensar isso. Se pudéssemos tirar vinho da internet, inevitavelmente acabava por não o fazer, porque as pessoas que trabalham nesses meio, para aquele vinho poder existir, se não são pagas pelo seu trabalho, a economia cai pela base. Não podemos acreditar que podemos ter acesso as coisas sem as pagar. As pessoas que vêm cinema à borla e não há outra palavra para isto, é um roubo. O problema é que isto cai em buracos legislativos e hábitos culturais onde ninguém sente que ao tirar de gratuitamente um filme da internet é o mesmo que roubar do supermercado. Obviamente que esse é ponto essencial. Mas, não vai ser possível ter profissionais a trabalhar se as pessoas não são pagas. Eles são pagos quando as pessoas compram os DVDs, ou compram um bilhete no cinema, ou vão a um vídeo clube alugar um filme. Não é possível sustentar o meio se as pessoas acham razoável e justo ver as coisas sem pagar.


Então é mais fácil distribuir um filme premiado em festivais, como é caso do Tabu?
LA: Nós só demos uma ajuda na distribuição em DVD. Os festivais têm esse lado de poder chamar à atenção sobre uma série de filmes. É mais ou menos como tudo na vida, como a marca do iogurte ou do pneu, as pessoas reconhecem o que é evidente e já tem nome. Obviamente que o Tabu já é um nome reconhecido, o problema é como que as pessoas que fazem coisas boas e passam despercebidas chegam a um determinado patamar? E desse ponto de vista, os festivais de cinema, como uma mostra de queijo, ou a festa da cerveja, é um sítio onde uma serie de gente incógnita chega e tem um prémio, que não lhe dá grande notoriedade, nem vida garantida, mas chama á atenção para algo que é especial, pelo menos melhor que o resto e que vale a pena provar. É óbvio para quem está a começar e não tem nome na praça, é para isso que os festivais existem. É preciso frisar isto, a importância do papel das políticas públicas culturais, é por isso que a maioria dos festivais é subsidiada por dinheiros públicos. É para isso que existem, para um público cinéfilo que não tem salas que passem a maior parte destes filmes e aí tem uma oportunidade, mas também é muito bom para quem faz filmes ter um espaço nobre para mostrar o seu trabalho.


Então considera que o trabalho do Instituto de Cinema e Audiovisual (ICA) é essencial neste processo?
LA: É absolutamente essencial. Não é possível nem em Portugal, e não quero discutir as nuances dos filmes independentes americanos que diferem do resto, nem na Inglaterra, em França, ou qualquer parte da Europa e até China é impossível ter um cinema de autor minoritário sem ter apoios públicos nenhuns. É impossível. Para termos cinema que não seja o americano de Hollywood em Portugal tem de ser o ICA. Se esta a fazer tudo bem ou tudo mal estamos a viver momentos de emergência e é preciso deixar que o país assente em qualquer coisa que não se percebe, para depois podermos chegar ao pé do ICA e dar a nossa opinião em como as coisas podem ser melhores. Criticar ou elogiar esta instituição é o reflexo do país, não sabemos o que vamos ouvir amanhã. Fundamental é fazer coisas melhores, mas agora não é o tempo de estarmos aqui a discutir detalhes num período de absoluta emergência nacional.

 

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