No processo acabas sendo a actriz, como é que isso acontece?
SC: Não sei. O personagem masculino foi inspirado levemente num amigo meu de Bruxelas, ele é o Great Gatsby, mexe-se de uma forma elegante e achei que ele tinha de ser o actor do filme. Não tinha experiência nenhuma, mas eu entendi que ele tinha de dar vida a aquele personagem. Eu e o realizador achámos que fazia sentido. Como em Bruxelas não há muitos actores anglófonos, ficámos num dilema e o realizador achou que fazia sentido que eu fizesse parte do filme.
Bem, tu a conhecias melhor do que ninguém.
SC: Sim e eu já estava muito envolvida e foi um processo muito natural. Não foi uma escolha, foi acontecendo. Foi um processo muito orgânico. Só o rapaz faz de marido, porque tem de ser e eu faço de esposa. Não sei se fazer de mulher foi a melhor opção, eu estava muito envolvida com o filme.
Estiveste envolvida em todos os processos deste filme. Produzistes, escrevestes e actuastes, o que gostas mais de fazer?
SC: Gosto mais de escrever. Gosto de desenvolver personagens. Também gosto da parte de produção. De certa forma é criar. Não tem que ser um trabalho administrativo, é muito criativo, transformar um guião em algo palpável. São páginas e torna-las num filme. Acho que é bastante criativo, não encaro como uma actividade chata. É bom juntar as pessoas certas para um projecto. De facto, prefiro escrever, embora seja uma actividade bastante solitária e a produção envolve trabalhar em equipa. São duas áreas distintas.
E como actriz?
SC: Gosto bastante. Mas, não é de todo um objectivo meu, não é uma necessidade. Preciso mesmo de escrever em vez de representar.
Referistes que pretendes fazer a segunda e terceira parte deste projecto.
SC: Primeiro tenho que encontrar um novo realizador. Tentar procurar parcerias. Um produtor e financiamento, esses são os primeiros passos.
Quando escreves um guião pensas em português, ou na língua que vais escrever?
SC: Eu em geral escrevo em inglês. O que em Portugal é um problema.
Porquê?
SC: Porque deveria estar direccionada para a língua portuguesa e não estou. Em termos de diálogo escrevo em inglês.
Mas, tens algo em mãos neste momento?
SC: Ando escrevendo. Mas, nada que se adeqúe ao universo português, porque são textos muitos anglo-saxónicos. Com seis anos fui para Holanda e frequentei uma escola americana, onde aprendi a ler e escrever em inglês. Os meus amigos eram provenientes de outras culturas. Não sabia o que era ter um amigo português. O ser portuguesa. Em casa não havia muitas referências em termos culturais, não havia música, nem a comida portuguesa.
Então, como é que falas tão bem português?
SC: Voltámos para Portugal. Vivi em Lisboa durante dez anos e depois fui para os EUA estudar.
Sentes-te portuguesa?
SC: Durante muito tempo tive problemas de identidade. Perguntavam-me sempre, mas és de onde, eu dizia que vinha de Portugal. Sim, mas nasceste aonde? Lisboa. Então a tua mãe é de onde? Lisboa. Então deves ser do norte com esse sotaque. (risos) Eu acho que tem a ver com facto dos dois pais serem portugueses, cria uma certa confusão nas pessoas. Se a mãe, ou o pai fossem de outra nacionalidade fazia mais sentido. Mas, o problema é ter dois pais portugueses e esta rapariga não fala bem português? Não entende calão? E não percebia, ainda hoje há coisas que dizem que não entendo.
Em que contexto crias o little film academy?
SC: Também foi em Bruxelas. Comecei por dar formação em teatro e escrita. Depois criei uma em cinema com o Bernardo Camisão. Adoro trabalhar com crianças. Foi uma semana intensiva tínhamos quatro grupos, dos cinco anos aos14 anos, no final da semana elas foram-se embora e eu senti que foi pouco. Foi giro, fizeram o filme e eles gostaram. Foi um processo muito engraçado, mas não podia ser só assim. O trabalho que eles fizeram foi muito bom, consegui fazer isso com mais tempo e desenvolveu-se mesmo. Acho que é muito positivo para as crianças.
Cá tivestes muitas crianças?
SC: Sim, mas isso teve ver com a organização. Estive a implementar a mesma ideia em Lisboa e vamos ver como corre. Estou habituada a trabalhar com uma maior dinâmica, como em Bruxelas, em que se pega no telefone, peço para usar o espaço, vamos colaborar e fazer uma parceria? As coisas funcionam de uma forma mais célere.
Esbarrastes com a burocracia?
SC: Sim, em Lisboa tem que se falar com o supervisor, marcar uma reunião, isso desencoraja muito. Não me sinto segura para tomar uma atitude mais arrojada ao ponto de alugar um espaço, tenho que ir com calma e deixar as coisas acontecer. Não foi o caso do FIFF’11, foi fantástico o acolhimento da iniciativa. Foi mesmo muito produtivo.