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A lírica de galiza

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Maria Lada é uma poetisa galega. Descreve emoções, dor, mas também discorre sobre as alegrias, sobre a magia do seu povo desde os seus 17 anos e já tem publicado cinco livros. Miguel Seoane é músico, com formação clássica, que a acompanha em veladas literárias que vão para além dos recitais de poesias. São encenações poéticas que aspiram inspirar o público que os acompanha, ou quem assiste pela primeira vez. Em itinerância pelo nosso país ouvimos o Nove com a Casa da Esquina.

Como é que surge este projecto com a casa da esquina?

Maria Lada: A casa da esquina organiza umas residências para artistas em Coimbra e ofereceram-nos um tempo para estarmos ali, montando um espectáculo e a proposta que criámos os quatro, o Filipe, o Ricardo, o Miguel e eu foi trabalhar sobre o meu livro chamado nove. São poemas para poder montar mais do um recital, que é o que faço com o Miguel. Leio os textos, recito os poemas do livro e ele toca, é como se fosse um concerto sem paragens. Então propússemos fazer algo mais, que se assemelha a uma peça de teatro, com acção, com imagens físicas e trabalhar sobre os meus textos. Então, escolhemos alguns e estivemos em Coimbra em Dezembro desenvolvendo ao longo de vários dias a maneira como poderíamos passa-los para cena e assim fizemos.

E como é que surge a parceria com a Maria?

Miguel Seoane: Eu faço música e falando com Maria decidimos não fazer o recital standard, com melodias. Eu faço uma roupagem com ambientes sonoros.

Crias sonoridades de propósito para os textos dela?

MS: Sim, há uns quantos sons que se repetem. O que eu faço é usar a guitarra de uma forma não convencional. Faço sons evocando coisas muito orgânicas, rasgando as cordas, golpes. Crio mais um ambiente, não tanto um concerto, dando importância primordial aos textos. Fazer um arredondamento, fazendo com que a música não interfira, ou que se sobreponha à palavra.

Como é que se parte de poemas para uma encenação? Como é que se faz essa transição?

ML: Bem, levo muito tempo escrevendo. Comecei a escrever e a publicar desde os 17 anos de idade. Comecei a trabalhar numa associação de poetas, em que cada qual escrevia os seus poemas com estilos diferentes, versos livres, sonetos. Dávamos uma importância primordial ao ato de transmitir os poemas as pessoas, através de leituras e recitais de poesias. Então sempre trabalhei muito com a posta em cena. Sempre fugi da imagem do poeta que está concentrado na leitura do livro e que apenas levanta a vista para o público. Depois tenho uma formação teatral que fiz na universidade e agora estou mesmo a trabalhar como actriz em espectáculos profissionais e então sempre tentei fazer uma coisa intermédia, do que apenas uma leitura normal quando vou apresentar um livro. É uma interpretação dos poemas. Então faço sempre esse trabalho, são recitais com um ponto de verdade, de teatro, de interpretação. O texto do ponto de vista teatral sempre me interessou muito. Fiz algumas experiências em Galiza com diferentes livros e quando conheci o Miguel começámos a fazer algo diferente. Construí uma cena e acho que a minha experiência teatral tem muito peso na minha maneira de ler.

O nove o que é?

ML: É um livro que escrevi depois do desastre do Prestige, que aconteceu em Galiza. Houve uma forte reação na sociedade e no meio ambiente, nas pessoas com quem eu andava, com os grupos de colegas e artistas. Houve uma forte reacção social abandeirada por artistas, mas também por associações de vizinhos, de gente do povo. Com base nesse material comecei a trabalhar sobre a dor e como um acontecimento externo às pessoas consegue recolhe-los numa ilha de indignação em Novembro que é o nome completo. É o mês em que o barco se partiu ao meio. É uma ilha para onde as pessoas fogem para escapar da dor. Dos diferentes tipos de dor, desde a amorosa, a mais física, das enfermidades, da dor social e da indignação de algo que não podes controlar. Então todo o livro fala sobre isso, uma ilha mítica que recolhe essa tradição das zonas marítimas, dos baleeiros que houve até o princípio do século XX. Recolhe essas histórias míticas de ilhas que quando há nevoeiro desaparecem. São as que eu ouvia quando era pequena e que adicionei ao livro.

Falastes há pouco sobre os recitais, como é que publico reage a esses encontros?

ML: A nossa experiência é muito boa. Na Galiza há uma longa tradição de declamar poesia e também textos literários. Sobretudo, a partir do século XIX o género mais habitual de expressão literária para o galego é poesia e de lê-la nos eventos literários. Desde que comecei com 17 anos, notei que havia por parte do público um certo aborrecimento, porque eu também achava o mesmo, os poetas estavam ali na sua torre de cristal recitando para as pessoas de uma forma muito pomposa, nada realista. Eram eventos que não me interessavam e achava que o público que estava a ver aquilo sentia o mesmo. Agora há uma linha de poetas mais jovens, como eu, que trabalham diferentes maneiras de dizer a poesia, seja com música, ou através do teatro. Nós mesmos participámos em recitais que são mais aloucados, divertidos e onde podemos leiloar a alma dos poetas. O público participa muito, diverte-se com a música e ao mesmo tempo ouvem poesia. Sem necessitar que o poeta tenha de escrever um texto divertido. Ele pode fazer a apresentação da maneira que quiser, envolto tudo numa espécie de acontecimento divertido e em ambiente de festa. Funciona muito bem, com os diversos grupos com quem estamos a trabalhar. Notámos que resulta tanto com o público que já esta habituado a recitais de poesia mais convencionais, como com as pessoas que nunca foram ouvir um poeta antes. Essa é a melhor crítica. Assim, é possível que no dia seguinte compre um livro de poesia meu, ou de outro escritor.

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