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De vento em popa

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O Programa de Observação de Pescas para os Açores (POPA) existe desde 1998 com o intuito de recolher dados de caris científico a bordo de embarcações de pesca comercial. Para alcançar este objectivo, são integradas equipas de observadores que tem como função a recolha contínua de dados relativos à dinâmica das embarcações e recolha de informação sobre as espécies alvo da pescaria nos mares do Açores.

Em que âmbito surgiu o popa?

Miguel Chancerelle de Machete: O popa surgiu em 1998, porque a determinada altura era necessário ter uma certificação “dolphin safe” nos Açores. Trata-se de uma iniciativa que começou nos EUA e depois chegou à Europa. Nos Açores como havia uma intensa actividade piscatória, capturavam-se por vezes golfinhos nos atuneiros. Estes animais eram também pescados para confecionar delicadezas gastronómicas, porque se apreciava a carne, ou como engodo para isco vivo. A pesca de salta e vara do atum tinha essa componente , embora os números fossem relativamente baixos comparativamente a outros locais, extra Portugal, foram estes dados que precipitaram as acções das organizações não governamentais nesse sentido e por isso, houve a necessidade de adoptar esta medida também no arquipelago.

Porque a Universidade dos Açores e a secretaria regional do ambiente e do mar tiveram a necessidade de criar um instituto para este efeito?

MCM: Não se criou um instituto. Na altura, o instituto do mar, a estrutura já existia, a Universidade dos Açores tinha condições, em termos de pessoal e know-how para poder gerir este programa, todas as entidades assim o entenderam, inclusive o governo regional. A origem esteve o “dolphin safe” mas depois as pessoas que estão a bordo recolhem muitos dados quer sobre a pesca, quer sobre as pescarias associadas. Temos uma base com mais de 2 milhões de registos neste momento, sendo a única da Europa no género que pode ser aproveitada tanto pela administração regional, como pelos investigadores e a indústria.

Fale-me um pouco sobre o trabalho dos voluntários nas embarcações.

MCM: Observadores quer dizer, hoje em dia não temos voluntários. Temos duas modalidades, uma de trabalhadores contratados digamos assim por alguns meses e voluntariado, mas nestes últimos anos nem sequer temos tido muitos voluntários, porque interessa-nos ter uma equipa permanente durante toda a safra dos seis meses. Os observadores são importantes porque vão ganhando cada vez mais experiência, recolhendo melhores dados e interessa-nos ter essa qualidade. Isso só funciona com pessoal especializado dentro do barco para monitorizar, acompanhar e fazer a cobertura da pescaria.

Então o que fazem contabilizam o pescado que é capturado, é isso?

MCM: Basicamente um observador do popa recolhe dados durante todo o dia e às vezes durante a noite. Que tipo de informação eles recolhem? O que diz respeito a operação de pesca, a tecnologia usada, que aparelhos utilizam, onde é que pescam, como é que pescam, que quantidades capturam e de que espécies. Fazem uma recolha exaustiva sobre a pescaria. Para além disso, durante todo o dia recolhem dados sobre as espécies associadas a pesca, as aves marinhas, tartarugas, ou se há ou não interacção de cetáceos com o evento de pesca.

A safra do atum concretamente quando começa e termina?

MCM: Normalmente, e digo isto, porque nestes últimos dois anos se tem alterado um pouco, mas por norma, começava no final de Abril e dura até Outubro. Nestes dois últimos anos começámos mais cedo, em Fevereiro já havia vários barcos a fazer captura de atum, chamo à atenção que o popa só intervêm em embarcações com mais de vinte metros, os mais pequenos também pescam atum e começam até mais cedo. Há de facto algumas alterações a esse nível, mas podemos falar de Maio a Outubro.

Mas, porque essas alterações ocorreram, o que mudou?

MCM: A frota propriamente dita mudou, hoje em dia, há cada vez mais barcos, quando falo de frota são embarcações com mais de vinte metros de envergadura, neste momento estão registados cerca de 20. No final da época os barcos tem recolher ao estaleiro, proceder as suas revisões e as embarcações mais pequenas, nesse âmbito, começam a safra mais rapidamente. Depois temos as condições climáticas que também se alteram, nunca temos um ano igual ao outro desse ponto de vista e isso implica também que espécies podem estar ou não presentes. O facto de dizer que nos últimos dois anos começou mais cedo não quer dizer que na próxima época a pesca seja feita um pouco mais tarde, começa mais cedo, porque por um lado, existe a hipótese dos barcos poderem ir mais cedo para a água  e por outro, há a presença das espécies nas águas açorianas.

No início do programa não houve uma certa resistência por parte dos pescadores?

MCM: Sim houve, o que é natural, não havia a experiência desse tipo de programas a bordo, os observadores eram pessoas a que os mestres, as tripulações não estavam habituados, houve ali uma fase de habituação, que neste momento esta ultrapassada e é raro haver uma questão.

Nem mesmo quando um dos elementos é do sexo feminino?

MCM: Sim, até porque como sabe as mulheres não são uma presença constante na pesca.

Mas, não é só isso, existe a crença que as mulheres dão azar.

MCM: De facto existem essas superstições, contudo já que temos tido a bordo investigadoras. Obviamente, à partida é um ambiente muito masculino, de trabalho duro e não por norma, por tradição não tem mulheres a bordo, mas penso que hoje em dia esta questão esta ultrapassada.

Abordando a pescaria propriamente dita, há uma diminuição da pesca do atum nos Açores, derivado a diminuição do fitoplacton?

MCM: É uma questão generalista, não posso afirmar se houve uma diminuição do fitoplacton nos oceanos, posso falar do que acontece em termos de pesca nos Açores. Se as espécies não têm alimento tem de ir para outro sitio qualquer alimentar-se, há anos em que esse fenómeno acontece mais do que em outros, mas desde que o popa existe não há um decréscimo acentuado, no início, nem indícios desse fenómeno nas capturas de atum. Em 2001, 2002 foram anos maus de pescaria nos Açores, mas depois tivemos anos muitos bons, estou a falar num espaço temporal de 15 anos. Claro que as coisas a 30 anos eram muito diferentes e provavelmente havia mais atum, naturalmente. Mas, isto tudo para dizer que 2007 foi um ano excepcional e 2009 comparado com 2001 foi muito bom. Há duas espécies que sustentam a safra nos Açores, é a espécie chamada bonito e o patudo, são as mais capturadas. Portanto, há várias alterações quer sejam do ponto de vista ambientais, por vezes a temperatura da água esta mais quente num determinado mês e no ano seguinte, esta mais fria, isso também influencia esses dados e depois há outra coisa que não nos podemos esquecer que é o esforço de pesca, estamos a falar de um recurso migrador, não explorámos algo nosso, nos Açores captura-se uma pequena parte. Em termos atlânticos globais falo de 80 mil toneladas de patudo segundo a FAO em 2004 e nos Açores falámos de 4 mil espécimens capturados, cá pesca-se a salto e vara que considerámos ser um tipo de pesca sustentável, mas existem outras de grande superfície como o cerco, cerca de 40% são pescados por “fishing aggreging devices”, objectos agregadores de peixe, cujo esforço de pesca é muito maior do que no salto e vara que só acontece praticamente nos Açores, na costa africana e brasileira.

Então se não se nota um declínio em termos de capturas nos Açores e o tamanho dos peixes tem vindo a diminuir?

MCM: Como coordenador responsável das pescas, a minha obrigação é recolher e torna-la disponível para os investigadores e outros grupos que trabalham nestas áreas, esse tipo de informação deve ser obtida das pessoas que investigam esse domínio. Eu, relativamente aos tamanhos posso afirmar que depende dos anos e se há alturas em que os cardumes são maiores, este ano o patudo teve tamanhos consideráveis, não temos conhecimentos de uma diminuição acentuada do tamanhos das espécies pescadas nos Açores.

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