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Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és

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Um dos debates de maior actualidade é a alimentação, sobretudo o que comemos ao longo do dia. Trata-se de uma questão que ganha relevância quando se verifica que há uma causa e efeito entre o que digerimos e a saúde pública e com grande impacto no ambiente. Então o que comer? Ou não? E porquê? As respostas da especialista em medicina biológica, Ana Moreira.

Uma das questões mais debatidas sobre a temática da alimentação são as farinhas. Diversos especialistas defendem que as refinadas são prejudiciais à saúde. Concorda com esta afirmação?

Ana Moreira: É verdade, além de termos um tratamento com químicos principalmente, excluindo a agricultura biológica, a dita convencional utiliza pesticidas em que os solos são sujeitos a um processo de muito cansaço, porque não se respeita os tempos de cultivo como antigamente. O milho é dos alimentos mais transgénicos que existem, por exemplo. No trigo a questão coloca-se no seu aspecto refinado que implica químicos e os ácidos que são usados para dar a cor branca que a sociedade pede. Este cereal deve ser integral, em inglês é mais interessante, porque diz-se “whole”, o que quer dizer todo, tem o grão e a capa. Mas, mesmo considerando que se trata de um trigo integral temos o problema de ser transgénico e de terem pesticida que advém do próprio cultivo.

Então qual é a solução?

AM: A solução passa por ter uma alimentação em que tem de haver rotatividade dos cereais, ou seja, trigo-sarraceno, centeio, aveia e os mais antigos, a quinoa, o milé e o amarante. O ideal seria comer um trigo integral e de cultura biológica. Desta forma diminuímos imenso o factor de risco e pelos nomes que referi podemos constatar que existem imensos cereais aos quais não se faz publicidade na televisão e nas revistas e que as pessoas não conhecem. Os que recomendo mais é o Kamut, a espelta e a aveia que não seja transgénica.

No entanto, há um factor económico relevante associado a esses produtos, são sempre mais caros, na actual conjuntura comer bem é difícil.

AM: Isso não posso justificar, uma família que mal se pode alimentar quer lá saber de agricultura biológica, nesse caso não há nada que possa dizer, não há dinheiro ponto final. Falando de uma faixa de pessoas que possa comprar, mesmo que não seja 100%, podem priorizar os legumes e as frutas, porque aí já há uma boa fatia que se previne. Não comemos o dinheiro literalmente falando, temos é que dar o devido valor a agricultura biológica, porque é óbvio que tem de ficar mais cara, não se gastam os solos, não levam pesticidas ou produtos que faz as plantas crescerem mais e com mais peso. A maçã biológica, por exemplo, são mais pequenas, não tem o tal aspecto tão brilhante, são mais tocos digamos assim, quem teve contacto com o mundo rural recorda na infância que a fruta tinha esse aspecto. Portanto há dois casos muito interessantes, por um lado há as pessoas que estão muito alertas para um tipo de vida em ressonância com a natureza e com o corpo e esse procuram não é preciso convence-los, são pessoas que não tem problemas de saúde, mas apostam na medicina preventiva. Os outros casos são as famílias com problemas de saúde e aí aconselhámos a cultura biológica, porque entendemos que de facto estamos a ajudar as pessoas a ficar mais saudáveis.

Outro dos seus cavalos de batalha são os açúcares, porque provocam diabetes, estão associados à obesidade e a outras doenças cardiovasculares.

AM: Certo, o açúcar branco e o sal refinado são os maiores inimigos que temos na actualidade, não é a crise, não é a troika são estes dois ingredientes, porque o açúcar sofreu um processo de transformação química que faz com que ao ingerirmos há uma serie de reações que começam na mucosa intestinal e acabam na matriz extracelular, portanto no tecido conjuntivo. O problema é que conseguimos relacionar o açúcar com a obesidade, com os diabetes ao nível mundial, mas ao nível das doenças osteoarticulares isso não é tão evidente cientificamente, a relação causa e efeito, entre a digestão do açúcar e a patologia, no dia-a-dia ao trabalhar com pessoas noto que melhoram imenso nesse tipo de doenças quando deixam de o ingerir.

Qual é a solução então?

AM: A solução passa por entender que o açúcar não é um alimento, ou seja, ninguém precisa dele, a ideia de que precisa um doce para poder trabalhar, ou então, não tenho energia, isso é exclusivamente uma desculpa. As pessoas que dizem essa frase estão doentes. Estão a necessitar de um mecanismo para terem energia, que é um factor psicológico, porque o açúcar vai aumentar o pico da insulina e esse estágio é transitório. Logo a seguir provoca uma hipoglicemia, porque primeiro fica cheia de energia, depois fica mais cansada do que estava umas horas antes. Isso implica deixar de consumir alimentos onde o açúcar esta mascarado, e se começar a ver é imensa coisa. Existem os mais óbvios, os chocolates, os bolos, os gelados e as sobremesas, mas depois há outros, como por exemplo, as bolachas e é preciso ler a composição dos produtos alimentares. Há a adição de açúcares também nas batatas fritas de pacote, ou no salmão fumado. O ideal é usar mel de cana, ou malte (é uma substancia liquida gelatinosa com a mesma consistência que o mel, só que é de origem vegetal), ou açúcar mascavado escuro.

É da opinião como vários especialistas defendem que o açúcar cria dependência?

AM: Sou, não é uma dependência directa, mas por um mecanismo imunológico que ocorre ao nível intestinal, há uma libertação de uma serie de moléculas que vão interferir em processos cerebrais, que nos vai dar a sensação de que necessitamos comer mais açúcar e que tem a ver com a flora intestinal isso esta mais que explicado. A dependência funciona como uma droga, que produz uma serie de substâncias que nos fazem querer comer mais.

Não é também uma dependência emocional? Há pessoas que comem chocolates para se sentirem bem.

AM: O chocolate tem triptofano e vai aumentar os níveis de serotonina e isso é o que vai causar dependência emocional, é o valor que lhe damos. Na realidade é uma dependência química, porque ao comer essa substancia esta a libertar o químico e não há ninguém que possa dizer o contrário. O que falou é muito interessante, porque quando não estamos bem vingamo-nos na comida, seja de forma generalizada, seja nos doces. Se reparar não há filme americano que se preze que não mostre uma mulher deprimida que não se “vingue” num daqueles baldes de gelado sentada no sofá a chorar e a comer. E isso por muito que não queiramos, embora não faça parte da nossa dieta mediterrânica, já existe na nossa sociedade e todo a gente tem gelado em casa. Actualmente há uma relação muito forte em como me estou a sentir e o meu corpo, no chamado jejum do fim do dia, em que as pessoas por norma andam numa correria e em constante stress, na rotina diária, depois no fim do dia há um relaxamento e acabam por comer tudo o que lhes apetece e após o jantar estão a ver filmes com chocolates, ou bolachas. Isto tudo começa na infância, porque erradamente dizemos as crianças o seguinte: se te portas bem dou-te um chocolate, ou um gelado. Se te portas mal não comes o que gostas. Portanto, estamos a relacionar um comportamento e depois levamos isto a vida toda, por isso, comemos o que comemos, por descargas emocionais.

Estamos num período em que se fala muito da alimentação e em particular nos produtos provenientes dos animais. Já tivemos a doença das vacas loucas, as pestes suínas, a gripe das aves, ou seja, todos os animais que consumimos levam todo o tipo de antibióticos e hormonas, porque o mercado exige uma produção de carnes constante. Como podemos sem destruir o planeta, continuar a consumir todo o tipo de animais?

AM: Temos de consumir animais de produção biológica, porque essa tem de respeitar certas regras nas quais os animais estão sujeitos a determinadas situações, ou seja, não lhes injetam antibióticos, ou hormonas, andam ao ar livre e possuem uma alimentação menos processada. Segundo, é verdade que temos excesso de proteína animal na nossa alimentação há dois animais que recomendo as pessoas que deixem de ingerir, ou pelo menos que comam em menos quantidade, a de porco e de vaca. Estas duas carnes são pró-inflamatórias, as restantes devem ser consumidas moderadamente e a juntar a tudo isso deve haver a ingestão de peixe de alto mar, evitar o de aquicultura. O problema das pessoas é que pensam que podem comer carne e peixe em todas as refeições o que é mentira. Há fontes de proteínas que são vegetais.

A vaca e o porco são inflamatórias por causa dos químicos que ingerem?

AM: Não o problema são as moléculas que tem presentes na sua musculatura e que depois vão provocar no nosso organismo a libertação de citoquinas que são pró-inflamatórios. As pessoas com mais patologias alérgicas vão ter mais crises e as pessoas com problema osteoarticular vão ter mais dores.

Isso também se estende aos queijos e aos leites?

AM: Sim, na minha opinião sim. Qualquer pessoa que inicie uma dieta não deve ingerir nada, durante 3 meses, de derivados de leite de vaca, cabra e ovelha.

E na infância aconselha o mesmo?

AM: Sim, a nossa sociedade não esta preparada para aceitar que existem outras variedades de cálcio, como os brócolos, arroz integral e sementes de sésamo e a algas. São alimentos bio disponíveis. Se calhar podemos contrabalançar para não assustar demasiado as pessoas, bem pelo menos após o período de 3 meses, o objectivo é verificar quais são as reacções do seu organismo e depois não sobrecarregar a dieta com esses produtos e variar com as fontes alternativas.

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