Um olhar sobre o mundo Português

 

                                                                           

h facebook h twitter h pinterest

Era uma vez no atlântico

Escrito por  yvette vieira fts bárbara fernandes

 

No primeiro festival internacional de contos da Madeira, Cláudia Fonseca, contadora de histórias acidental e psicanalista de profissão, fizeram as delícias do público narrando contos sobre a sua família nordestina complicada, quase mítica, mas cheia de muita cor e vivacidade.

Gostaria de saber como é que uma pessoa se torna contadora de histórias?
Cláudia Fonseca: Olha, essa é uma pergunta difícil de responder, porque tenho a ideia que cada um faz um percurso diferente. O caminho de cada um, é como de cada qual, não há um único para ser contador de histórias. Nós sabemos que os contadores modernos, urbanos, não tem a tradição familiar de contar histórias que passam de pais, para filhos, por isso mesmo, a minha investigação indica que são percursos muito particulares.

O teu percurso começou por uma tradição familiar ou pela investigação que estas a fazer?
CF: Nem uma coisa, nem outra. Começou por acaso, se eu for olhar para átras, eu diria que havia na minha família uma pessoa que me contava contos, eu tenho uma vaga ideia que, estou a investigar agora no doutoramento, de que há uma transmissão transgeracional nada explícita, mas que existe sempre na família um contador identificado, não diria em todas as gerações, mas um em cada duas. Se eu for olhar nesse sentido, posso dizer que havia uma avó paterna era quem contava histórias. O meu percurso começou por acaso na biblioteca municipal de Oeiras, onde ia com a minha filha, muito pequena, bebé, levava-a muito lá, porque queria que crescesse rodeada de livros, de histórias de encantar e ficava sentada com ela no colo, em frente, depois mexia nos livros, contava, cantava e um dia a bibliotecária me disse que tinha notado que vinha todos os dias com a minha filha e perguntou se queria fazer uma acção de formação com a Cristina Tabelin, sobre narração. Eu não fazia a menor ideia do que era um contador de histórias e como não sabia o que era, vim, fiz um serão e isso já foi há dez anos.

Mas, agora estas a fazer um doutoramento e porquê escolheste esta temática?
CF: Eu sou psicológa-psicanalista, há cinco anos fiz uma proposta de investigação juntando essas duas partes, a psicanálise e a narração e tentei perceber aquela primeira pergunta que você me fez, como é que alguém se torna um narrador oral?

Existem diferenças entre os contos narrados no Brasil e em Portugal?
CF: Todo o meu percurso de narradora foi feito aqui em Portugal, a da narração moderna, urbana conheço pouco. O conhecimento que possuo é da narração tradicional, isso sim, porque a minha família é nordestina e no Nordeste existe uma grande tradição dos contadores de história, de violeros.

Nos contos nordestinos, daqueles que ouviste toda a vida, de que se fala?
CF: A tradição oral no Brasil é muito curiosa, porque se fores ver os contos tradicionais tem todos equivalentes as narrativas europeias, mas há uma mistura, uma mescla, uma fusão e então encontras histórias que juntam dois ou três contos tradicionais europeus num só. Existe uma história que é a Dona Labismina que funde três contos que é cinderela, a princesa pele de burro e a narrativa dos dois irmãos cobra. São histórias que muitas vezes resultam da colonização portuguesa, depois os escravos que foram para lá e da população indígena e dessa mistura saem mesclas incríveis. Mas, reconheces muito bem na tradição brasileira a viagem que os contos europeus fizeram até o Brasil.

Dos contos que narras tens um preferido?
CF: Sim, eu acho que o nosso repertório ao longo do tempo vai modificando, mas há aqueles que são os mais queridos e ficam conosco ao longo da vida e dessas narrativas tenho dois ou três que conto há muito tempo. É uma relação de amor.

Quando contas uma história vais mudando alguma coisa, alteras algo?
CF: Sim, há narradores que parecem ter quase um guião, contam da mesma forma, até conseguimos perceber, quem ouve muitas vezes essas histórias, onde vai entrar aquela vírgula. Acho lindo, mas sou incapaz de fazer isso! Quando conto uma história já a tenho dentro de mim e cada vez que narro vejo a forma como as pessoas vão interagir, se vão falar, como se esta a compôr a sessão, isso faz diferença, se estou sozinha ou estou a contar com alguém, porque em Portugal tem essa tradição muito bonita de partilhar sessões, acaba por ser sempre diferente.

E na tua experiência a contar histórias em Portugal, o público é diferente?
CF: Eu diria que o público é sempre diferente em cada sessão, independentemente do lugar ondes estas. Eu já contei histórias em países e locais diferentes e cada sessão é única, não te posso dizer que tal dia o público vai ser assim, ou assado, não sei, não consigo. É como um parto, a gente já sabe mais ou menos o que acontece, mas de facto não sabemos como vai correr e as sessões são assim também, temos uma ideia do que levámos e do público para quem vai contar, mas nunca sabemos como vai correr, isso é que a delícia, dá um friosinho na barriga, porque há a alegria de cada encontro.

Deixe um comentário

Certifique-se que coloca as informações (*) requerido onde indicado. Código HTML não é permitido.

FaLang translation system by Faboba

Eventos