Há pouca escrita para teatro em Portugal, poucos jovens escritores, porquê?
JC: Há poucos autores em Portugal, porque nunca tivemos um grande historial de dramaturgia no nosso país. Somos um povo de poetas, de escritores, mas nunca de dramaturgos. É preciso ter uma veia teatral, temos prosa, quando lemos Eça temos de o imaginar em palco, um bom dramaturgo pode fazer uma boa adaptação. Contam-se pelos dedos das mãos os autores para teatro, o que é uma pena, porque temos a revista, que tem um componente muito critica, muito relacionada com o teatro vicentino, mas que foi perdendo essa capacidade e quando chegou o 25 de Abril de 1974, acabou tudo. Ninguém escreve para teatro. Neste momento, a peça que estou a fazer são de dois autores espanhóis e fez-se uma adaptação. Os espanhóis continuam a ter autores novos, rapazes novos, Eduardo Galàn e Pedro Gomez são jovens. Tivemos um dramaturgo que ganhou um prémio e que se matou logo depois, qual é a saída?
Muitos consideram que este é um dos períodos mais negros do teatro em Portugal, partilha de esta ideia?
JC: Não, não. O teatro em Portugal esta sempre em crise.
Rui de Carvalho: Houve um homem revolucionário, numa altura em que só existia o Teatro Nacional e mais nada, que era o Vasco Morgado. Na sua loucura investiu tudo o que tinha no teatro e conseguiu levanta-lo e anima-lo.
Então o que faz falta ao teatro na actualidade?
JC: É cativar os jovens nas escolas. Nas aulas de português é essencial mostrar que é atractivo o ingresso nas artes, depois como não acontece isso, não há teatro juvenil, á séria. Lembro-me que no teatro nacional formou-se um agrupamento para jovens e foi um êxito. Puseram-se vários autores, um Carlos Ferreira, um António Torrado, estou a falar de autores consagrados de literatura portuguesa, a escrever dramaturgia. A Maria Alberta Meneres faz uma adaptação linda de "falar verdade a mentir" do Almeida Garrett, não desvirtuando o texto, transformando-a num musical. Foi dos espectáculos que mais deu dinheiro à D. Maria II e depois acabaram com ele.
Então é uma boa gestão que falta?
JC: Eles não percebem nada de teatro. O teatro vive dos seus elementos artísticos, actores, técnicos, autores e músicos. O teatro nacional acabou, mas ficaram lá os burocratas todos, a ganharem fortunas, tanto como quando havia uma companhia. Mais, tem um orçamento de peso e não faz sequer uma produção, porque tudo o que tem é anterior.
RC: Tem 123 pessoas e só 23 são actores.
JC: Tu não podes começar dar as pessoas teatro de vanguarda, tens de ensinar as pessoas a gostar. Começas por baixo, pelos mais jovens. Eu dei aulas no secundário e a primeira coisa que ensinei aos meus alunos foi ir ao teatro. Comecei a leva-los a ver um Óscar Wilde, um Almeida Garrett, grandes autores para o palco. Actualmente, são todos grandes espectadores de teatro, não conheço nenhum que falha, até porque pode aparecer aqui e ali algum bom actor. Agora, foram feitos, criados e orientados por mim para serem amantes de teatro. Essa é base. Os jovens, com pouco mais de vinte anos, estão todos a voltar ao teatro. Estão fartos dos talk shows e de estar à frente da televisão. Eles vão a tudo. Crise é uma coisa de que se fala muito, é mais questão económica. Um teatro que cobra doze euros para assistir a um espectáculo de duas horas, não é nada de extraordinário. A diferença que se nota em relação á geração anterior, é que os jovens vão, rapazes e raparigas, antes era só as mulheres que iam ao teatro e os homens iam ao futebol.
Qual é o futuro então do teatro no nosso país, continuar a ser financiado pelo Estado, ou as companhias vão ter ir buscar sempre formas de financiamento?
JC: O Estado deve apoiar. Um teatro independente é o mais dependente de todos. Eu concordo que haja um apoio, mas as companhias devem trabalhar para captar público, porque senão é a teoria do Carrilho, o teatro é só para uma elite. Mas, o teatro não é apenas para alguns, é para o público em geral. Temos de dar aquilo que eles querem ver. Em Espanha fizeram um referendo ao povo perguntando se queriam manter a zarzuela e o público disse que sim e eles renovaram-na. Cá nos estamos acostumados a companhias que fazem uma ou duas produções que podem ser muito boas e eu não ponho isso em causa, mas gastam o erário público para pagar os ordenados. Devia haver dinheiro para as montagens. Na minha produção eu não preciso de muito, só quero que me abram a porta, que fiquem com 10% no valor dos ingressos, mas que nos ajudem na divulgação, mais nada. Agora, se não aparecer nada a publicitar os espectáculos é mau. Estive no último fim-de-semana na Póvoa do Varzim, no casino, uma semana antes, eles espalharam cartazes nos cafés e nos mopis e tivemos casa esgotada. Não é preciso muito. Aquilo foi uma pequena ajuda.
Na Madeira, acha que o trabalho feito em prol do teatro é pouco? Frisou o facto das companhias provenientes do continente não conseguirem montar espectaculos no teatro Baltazar Dias.
JC: Há quanto tempo não tens um espectáculo de teatro aqui? Antigamente esta casa tinha um protocolo de colaboração com o teatro nacional. Acordo esse que terminou e os espectáculos que cá estiveram foram nessa remessa e a partir dessa altura deveria ter-se procurado alguma solução, temos que reactivar isto, é possível que funcione, não se pode perder esta dinâmica. Criou-se o hábito de dizer que os madeirenses não gostam de teatro, é treta. Gostam e prova disso foi o "passa por mim no rossio" com casa cheia. É preciso criar o costume e isso dá trabalho. No meu concelho, em Vila Franca de Xira, havia uma casa que era a sociedade filarmónica de recreio alverquense que estava as moscas, comecei pouco e pouco a levar companhias para fazer teatro, primeiro um Fernando Mendes, uma Marina Mota e depois o João Lagarto e as conversas sobre Eça de Queirós e o que acontece? As pessoas começam a vir e acabam por voltar para ver os outros espectáculos. Todos os meses as pessoas se habituaram a ver teatro em Alverca. Aqui precisam de fazer o mesmo, este teatro é lindíssimo. Claro, que tem alguns custos para a Câmara, mas são compensados, por ver esta casa com as suas portas abertas e com obras teatrais de grande calibre. Acho que ia ser maravilhoso.
Fale-me um pouco desta peça que esta em tournée pelo país. A curva da Felicidade de Eduardo Galàn e Pedro Gomez. O que o atraiu neste texto em concreto?
JC: É um texto muito engraçado. É uma conversa de homens sobre mulheres. Trata-se de um homem que é abandonado pela mulher e que vai ter que vender o apartamento, há vários compradores, um deles é até um amigo de infância e toda a peça gira em volta desse espaço e a negociata que os outros querem fazer, o amigo inclusive que sem grandes escrúpulos quer ficar-lhe com o apartamento. Muita gente se vai rever em várias ocasiões. É um texto que as mulheres adoram, principalmente as mais velhas que já viveram algum tempo com homens.
Porque falam mal ou bem de nós?
JC: É assim, falam mal, mas não podem viver sem elas. É um pouco à maneira dos Monty Phyton. Tem um final engraçado e vão ver quatro cromos, quatro malucos que decidiram fazer este espectáculo de qualidade. O próximo é no Porto, no Rivoli, a partir do dia 13 de Outubro, gostava de vir até a Madeira e os Açores.