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O trapezista da comédia

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César Mourão é um actor que assume várias peles, mas é na comédia que se sente mais à vontade. Considera-se uma espécie de artista sem rede, quer no tipo de comédia que exercita, quer em termos do percurso da sua carreira, como mostrou no Forum Madeira  Humor Fest. 

Começaste com o Herman José e agora tens um filme no cinema achaste que seria esta a carreira que pretendias?
César Mourão: Esta tudo certo, mas sete anos antes do Herman eu já tinha a minha carreira. Eu não começo com ele, muito longe disso, ele foi uma parte importante do meu percurso obviamente, tanto que sou um fã incondicional e sempre fui. Hoje em dia eu não penso muito no percurso, gosto de fazer coisas em que me sinta bem, teatro acima de tudo, depois cinema e no fim televisão, só que são trabalhos e formas completamente diferentes.

Consideraste um cómico?
CM: Não, considero-me um actor. Um humorista, ou cómico não tem de ser um actor, o meu trabalho e formação na arte da representação e se tiver de fazer um filme com uma personagem com carga dramática faço. O humor surgiu sem querer é uma praia onde me sinto muito bem e dá-me muito gozo, faço isso mais hoje em dia.

Achas que por teres tido tanto sucesso nessa área humorística que ficas catalogado nessa vertente e só te oferecem trabalhos cómicos?
CM: Sim, neste filme da “Canção de Lisboa” o meu personagem tem muito de cómico, poém possui um arco dramático que também acontece e não é só um registo de humor, há um lado sério e ainda canto e isso é engraçado. No “Pátio das cantigas” pelo contrário não havia muito humor, talvez era o personagem com menos graça de todo o elenco que lá estava. Portanto, fico catalogado com muito orgulho como cómico e gosto de ser humorista, apenas também sou actor e com o tal posso fazer outras coisas que não essas.

Então consideras como muitos artistas sublinham que fazer humor é muito mais exigente ao actor, porque é mais difícil fazer as pessoas rir?
CM: Eu não sei se é mais difícil o que eu acho é que depende da forma como cada um o encara. Ao fazer uma cena com ar dramático se as pessoas estiverem caladas numa sala nós interpretámos como estão a gostar imenso, porque não se ouve um pio, se vamos ao cinema e vemos um filme dramático as pessoas também estão caladas, deduzimos que estão a gostar imenso. Na comédia é imediato, as pessoas riem-se se estão a gostar, se não se riem não estão a gostam, é mais fácil avaliar se resulta ou não. Eu, por exemplo, sou um espectador de comédia em que nunca me consigo rir, não sou uma pessoa de sair de um espectáculo e rir-me, às vezes acho espectacular e até digo que é das melhores coisas que já vi e há muitas pessoas que são assim. Agora, se tivermos muita gente assim num espectáculo de comédia, pelo menos duzentas pessoas, eu sei que é horrível. Não tem a ver com o facto de gostar, ou não gostar, mas com o facto de ficarmos admirados e não nos conseguimos rir, a comédia é mais imediata a pessoa gostou ou não gostou, no drama se estão caladas depreendemos que gostaram da cena dramática, mas pode não ser o que acontece.

Onde então é que entra o stand-up?
CM: Não entra. Deixa-me corrigir, eu não faço stand-up nem nunca fiz. Esta forma de comédia é um texto que se escreve em casa com piadas já preparadas e subimos a um palco com todo esse material sobre determinados assuntos. O que faço é improvisão, eu chego, não tenho nada absolutamente preparado, faço uma improvisão ou outra, chamo uma pessoa faço uma música sobre a sua vida e nada daquilo é preparado, é improve comedy, uma improvisão teatral, não no absoluto do termo, porque não é um espectáculo, porém não é stand-up, porque não o faço e nem tenho jeito.

Como é um espéctaculo sem rede, já aconteceu as pessoas não gostarem?
CM: Nunca me aconteceu, felizmente. O desafio é esse, quando vamos a um circo dámos mais valor a um trapezista, e não sabemos bem porquê, que faça o seu número sem rede, sem nada, do que um artista que tenha uma rede em baixo. Tem ambos valor, porque as manobras são igualmente difícieis, só que um tem rede e o outro esta sem segurança nenhuma e não há diferença. O que eu não faço não é diferente do que os meus colegas fazem, é um trabalho complicado, é outro tipo, porque o deles tem um texto e estão safos porque sabem do que vão falar, eu faço exactamente o contrário, são as mesmas manobras, mas sem a rede.

E nunca tens brancas?
CM: É impossível ter uma branca quando não tenho nada para dizer. Portanto, eu não me posso esquecer daquilo que não tenho para me lembrar. Como eu não tenho nada para recordar, não há branca, apenas podem haver silêncios, mas esses existem, porque a arte da comédia é o timing e não a piada que lá esta escrita. Se eu der um texto a um segurança de um shoppping e der o mesmo ao Raúl Solnado, as mesmas palavras com as mesmas vírgulas não vão ter piada na voz do segurança, à partida, por outro lado, vão ter imensa graça com o comediante. Não é o que esta escrito é o timing em que é feito, a destreza com que nos queremos levar o público e não com aquilo que o público pensa que vai sozinho.

Em todas estas áreas por onde te moves o teatro é o teu espaço preferido?
CM: Sim, a minha área preferida é o teatro. É incrível ter essa capacidade de levar o público ao riso como quero e por onde quero e não pelo que eles acham que vão rir e isso é incrível. A magia da televisão e do cinema são incríveis, prefiro a última, é mais mágica e uma manobra.

Vamos falar da “Canção de Lisboa”, quais foram os desafios de uma personagem tão emblemática, perpetuada pelo Vasco Santana?
CM: Na verdade o desafio não era muito grande, porque não é uma imitação do Vasco Santana, eu não tenho peso nenhum e o actor tinha muito. Tenho apenas orgulho e respeito, porque ele a interpretou. Agora, o filme não é uma imitação, quer ser outra coisa e tem capacidade para ser outro filme, mas tem a mesma permissa, ou seja, é uma pessoa que estuda medicina e não estuda nada, as tias julgam que é médico e ele não é. O desafio é o mesmo, porém é feito de outra maneira, é a mesma coisa que eu lhe pedisse para desenhar um girassol e a uma menina do Bangladesh, vão ser duas flores diferentes.

Sim, mas como todos os portugueses de várias gerações, concerteza que viste este filme mais do que uma vez, acabas por ter sempre no fundo da tua cabeça a personagem que é inesquecível.
CM: Sim e é inesquecível e tem algumas partes do filme que faço “ipsis verbis” de próposito, a parte do exame é exactamente transcrita do filme, é uma homenagem e logo aí estou mais calmo por não ter que imitar.

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