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O verdadeiro homem aranha

Escrito por 

É guarda da natureza da reserva natural das Desertas desde o dia 14 de Agosto de 1988. Alamberto Silva trabalha em prol do ambiente já faz 25 anos, no mesmo ano em que se comemora com sucesso o aniversário desta área protegida. Um trabalho que desenvolve com enorme paixão, principalmente no que se refere, as tarântulas venenosas destas ilhas.

Como é que começou a sua actividade como guarda da natureza?
Alamberto Silva: Sou dos guardas da natureza mais antigos, já estou cá desde que começou como reserva. Fez 25 anos que vim para cá. Sempre me interessei pelos animais, mesmo antes de vir para o parque, especialmente insectos e plantas. Era o que gostava mais. No início, isto para mim era uma novidade, porque há espécies diferentes que são comuns à Madeira, mas outras são exclusivas destas ilhas. Como gostava de aranhas desde jovem e já as apanhava nessa altura, nas Desertas comecei a observar o seu comportamento, fazia experiências sobre o seu modo vida, de como se alimentavam para depois comparar com as da Madeira. Outra das coisas que achei fascinante são as tarântulas, na altura eram consideradas as maiores do mundo, do género científico hogna e da família dos licosídeos. Ainda cheguei a ter alguns espécimens em cativeiro e como todos os anos faço uma apresentação escolho sempre a tarântula-das-desertas, que é a maior de todas.

Mas, existem três espécies de tarântulas pelo que percebi.
AS: Sim, existem 3 espécies nas Desertas, mas no arquipélago da Madeira, há 53 aranhas. Duas tarântulas são comuns à ilha da Madeira, ou seja, são endémicas do arquipélago. A mais pequena de cor castanha que aparece na Madeira e no Porto Santo é a "hogna insular". Depois temos a "hogna aerica" que também existe nas duas ilhas e finalmente a "hogna inges" que é endémica das Desertas, é muito grande e só são visíveis no Vale da Castanheira. Durante o dia esta espécie esconde-se debaixo das pedras e de noite sai para caçar. Esta tarântula alimenta-se de pequenos insectos e é muito agressiva.


Qual o seu tamanho em termos de diâmetro?
AS: Com o corpo, no caso das fêmeas que são mais corpulentas, chegam a medir os 5 a 6 cm, com as patas esticadas chegam até aos 12 cm de comprimento.


Em termos de comportamento como se distinguem?
AS: Só se distinguem em termos de coloração e tamanho, porque a morfologia destas aranhas é mais ou menos idêntico.
Todas caçam à noite?
AS: Sim, todas. Variam no tamanho, na coloração, em termos genéticos, quando são feitos estudos nesse sentido, ou através da genitália da fêmea e do macho, estas são as únicas formas de distinguir as diferentes espécies.
Na copulação em outras espécies de tarântulas as fêmeas matam os machos, no caso destas aranhas também acontece?
AS: Sim, também acontece. Há várias espécies de aranha onde isso acontece e não apenas com a famosa viúva negra, no caso destas tarântulas acontece e realmente quanto termina a copula os machos fogem logo, porque as fêmeas os perseguem.

 

Depois da fertilização o saco de ovos tem capacidade para quantas aranhas?
AS: De 100 a 200 tarântulas bebes.

 

A taxa de sobrevivência é muito alta nestas ilhas?
AS: Não, uma das razões advém do facto de terem muitos predadores, como as lagartixas, ou mesmo as outras espécies de aranhas. Por vezes, o próprio meio ambiente tem influência, devido a uma escassez de alimento, basta haver um ano mais seco, ou uma inundação devido à chuva. Só a partir de um certo tamanho deixam de ter predadores e passa a ser ela própria o caçador, ou seja, só conseguem ser mortas pelas da sua própria espécie, ou por espécimens maiores, ou ainda mais jovens. As tarântulas mais velhas são comidas por norma pelas mais novas.


Então em média quantas sobrevivem? As colónias possuem quantas aranhas?
AS: Tem mais de 1000 mil no vale da Castanheira.


É na mesma uma taxa de sucesso muito elevada?
AS: Sim, mas o vale é bastante grande. Mas, pode oscilar no caso da seca de 2002 a população desceu significativamente. Foi um ano muito seco, com muito pouco alimento, a maioria morreu com a secura e elas começaram a caçar-se umas às outras. Como faltou o alimento base recorreram a outras espécies mais pequenas e aí a população baixou. No Vale da Castanheira existem tricets com 15 metros que nos permite fazer as contagens das aranhas todos os anos. Só em 2002 a contagem desceu bastante em relação aos outros anos. Cheguei nesse ano a ver inúmeras tarântulas comidas pelas da sua própria espécie.


Não comem então só as outras espécies de aranhas?
AS: Não, são também canibais.


Também me referiu que existem outras espécies de aranhas no arquipélago.
AS: Sim, é verdade ao todo são 53 espécies identificadas, mas existem mais ainda.
Ninguém imagina numas ilhas algures no Atlântico que haja tanta diversidade.


AS: Sim, é verdade. Só para as Desertas estavam identificadas 10 tipos diferentes de aranhas até princípios de 2010, entretanto, verificou-se que haviam mais, graças ao estudo de dois investigadores, o Pedro Cardoso e o Luís Crespo, ambos biólogos, da Universidade dos Açores. Como conhecia as espécies por identificar, foi com eles aos locais, apanhei alguns exemplares e depois começaram a identifica-las através da genitália da fêmea e do macho e chegámos as 53 espécies diferentes.


Mas, há mais?
AS: Sim, ainda há algumas por identificar.
Então como é que chegaram até aqui?
AS: O que acontece com as aranhas em geral, é que quando eclodem os ovos, elas em pequeninas lançam um fio de seda para o ar, a partir do momento em que vento bate nesse fio da base, e se sente mais leve, ela corta-o e voa, o que lhe permite atravessar um oceano apenas empurrada pelas correntes de ar. A maioria chega até aqui assim. No caso das tarântulas, e de espécies de maior porte, chegam em troncos que flutuam no mar. Verificámos que depois do 20 de Fevereiro, uma aranha chamada "dysdera crocata", que é comum na Madeira e nas Desertas não existia, no final de 2010 notámos a existência dessa espécie na reserva, quando antes não tinham sido nunca avistadas. Julgámos que vieram arrastadas pelo temporal em troncos de árvore que permitiu que chegassem até aqui. E actualmente, esta aranha esta presente nas Desertas.


Então muitas não são endémicas das Desertas.
AS: São endémicas da Madeira e Porto Santo. Outras são comuns na Europa e depois temos as espécies que são exclusivas destas ilhas, que basicamente é a tarântula das desertas e uma aranha mais pequena, que é a "araneae madeiren". Entretanto já ultrapassámos as 10 espécies endémicas que existem só na Deserta Grande. Estão mais ou menos identificadas só falta mesmo colocar o nome.


Em todos esses anos de actividade com aranhas nunca houve um azar?
AS: Claro que sim, acho que já foi mordido por quase todas as aranhas venenosas. (risos)


Então esta imune!
AS: Sim, quando era mais jovem uma vez cheguei a ficar com febre, agora, levo uma picada e não acontece nada. (risos)

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