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A estrela cantante

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Danae conta as histórias de ninguém. As suas composições brincam com vários ritmos musicais que a influenciaram desde a sua tenra infância até a idade adulta. São as memórias de Cuba, de Cabo Verde e de Portugal que transpõem para as suas canções inundadas de sonoridades e tonalidades inusitadas. É a nova música africana, o novo crioulo, numa voz doce, plena de significado, que nos remete para uma viagem sem fim.

Qual é a diferença entre o teu primeiro álbum, “condição de louco” e o “cafuca”?

Danae Estrela: O “cafuca”, o segundo álbum, foi mais consciente mesmo na escolha dos instrumentos. Estive mais presente na direcção musical. O meu primeiro trabalho, “condição de louco”, a base era a guitarra e voz. Não tinha consciência do que estava a fazer, não programei seguir determinado caminho. Aconteceu em Coimbra. Os meninos da rádio universitária fizeram-me essa brincadeira, depois conheci o Pedro Renato que ouviu a maquete que eles gravaram e logo convidou-me para trabalhar. Decidi então experimentar, a primeira vez fiz tudo, mesmo as composições, as músicas e os meus pais nem se deram conta, fazia-o com amigos, no quarto.

Esta fusão de estilos musicais que se ouve nas tuas composições foi sempre algo que trouxestes contigo desde o primeiro álbum?

DE: Sim, as pessoas sempre estranharam muito que uma menina que é cubana e cabo-verdiana canta-se em português, mas sabes, a música é língua franca, não tem barreiras, tens é de soltar a imaginação, seja em português, em inglês ou em crioulo. Eu também sou crioula, nasci em Cuba, cresci em Cabo Verde e vim para Portugal. Vivo cá. É tanta mistura. Daí os novos crioulos.

Quem são então esses novos crioulos?

DE: Nós somos quatro pessoas, aparecemos só no “Cafuca”, daí falo de tomada de consciência, de trazer para fora já um conceito. O primeiro álbum partiu de uma forma intuitiva, neste segundo trabalho discográfico, foi do estilo, o que esta a acontecer aqui? É um conceito novo, porque não é só fazer música de fusão, as composições acontecem.

Já imaginavas o “cafuca” com todos estes novos instrumentos?

DE: Este novo álbum não. As tablas indianas é um instrumento raro, de música clássica indiana e a forma como o Raimund Engelhardt toca e como me acompanha é fantástico. Conhecemo-nos no Tejo bar. A história é engraçada, eu era muita tímida e o Sérgio que trabalha nesse bar quase não vê, é practicamente cego, para picar-me durante um concerto decidiu apagar mesmo as luzes, nesse mesmo momento os meninos chegaram e o Raimund e o Johannes Krieger, o trompetista, decidiram “responder” à minha música sem nos vermos. Só um ano depois é que falei com o Engelhardt e que começámos a trabalhar. Daí trazer para a mesa o conceito dos novos crioulos. Lisboa é uma cidade muito cosmopolita, as pessoas encontram-se aí, são tantas as cores e as paletas são imensas. Somos nós, os crioulos.

Este disco tem mais de Cabo Verde ou não?

DE: Este tem. O “cafuca” é uma lamparina que as pessoas fazem, são os pontinhos luz dos pescadores que estão no mar. O cafuca é isso, nós somos pontinhos de luz e é o partilhar esse ponto que é meu, é teu e é de todos. Também foi um trabalho de pesquisa, da palavra cantada, de tradição oral, tive que falar com as pessoas mais velhas, perguntar como se dizia uma palavra correctamente e a sua ligação. Cabo Verde precisa disso, é um país relativamente jovem desde a sua independência e eu acho que é preciso buscar o antigo e transforma-lo para o novo, porque são os novos crioulos que trazem esta nova abertura, para poderes falar, improvisar e comunicar.

Referistes numa entrevista que os músicos cabo-verdianos improvisavam pouco, qual foi o porquê dessa afirmação?

DE: Eu procurei o individual de cada músico, independentemente se um era do Brasil, ou se estava cá, eu fui cutucar o individual de cada um. Trazer o macro para o micro e vice-versa. Mais que improvisar foi brincar e isso não acontece só com a música, na vida em geral é assim. As pessoas vão crescendo e esquecem-se de brincar, mas em velhotes voltámos a esses tempos. Isso é giro. Foi sempre uma coisa de que gostei desde criança, foi muito regila, parti a cabeça, feri os joelhos, mas havia sempre algo que me prendia, uma boa história e o tom de voz que a contava.

Por esse motivo contas muitas histórias nas tuas canções?

DE: Sim, são muitas histórias. Algumas são vividas, outras são sentidas, outras ainda são vistas de perto, como a de Ângela de Alfama. Nunca falei com ela, mas via-se-lhe na cara, por isso a canção fala de uma caricia de cicatriz, ela tem uma história de vida que se vê, que tem algo de sombrio, de pesado. Se só tens escuro na tua existência, não vês a luz e vice-versa.

Quando tocas música cabo-verdiana em Cuba eles identificam a mesma raíz africana ou não?

DE: A música cubana tem muitos ritmos africanos, usa o congo, por exemplo. O meu ritmo é mais ligado ao Cabo Verde, que por sua vez também tem muita mistura. O que é bom é as pessoas identificarem-se por dentro. Podes pensar que não tens nada de música portuguesa, mas a forma como tocámos a guitarra, nós partilhámos isso. Em Cuba, não fiz um concerto oficial, só tenho tocado para a família e para os amigos, mas é por isso que falo que a música é uma língua franca nesse sentido, as pessoas fecham os olhos, fazem a sua viagem e transportam-se. Não é minha, é de todos. É diferente porque não é palpável, tu sentes com vários sentidos e isso é diferente.

Estas a preparar um novo álbum?

DE: Sim, já estou a trabalhar nisso. Estou a convidar amigos, músicos, mas a ideia é trabalhar em duetos.

Achas que é mais intimista?

DE: É mais intimista, mas ao mesmo tempo é aberto. Quando tens uma grande banda, há uma hierarquia nos músicos, tens que ter uma direcção e até chegar a uma improvisação leva o seu tempo. É um trabalho mais matemático e num dueto é mais dinâmico. És tu, outra pessoa e o público. É outra energia. Já comecei a contactar os músicos, alguns são da Finlândia, Cuba e outros de Portugal. Somos amigos. Vamos partilhar. Esse é o ponto de partida.

http://www.myspace.com/danaexdanae

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