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Uma aventura no topo de Portugal

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Um grupo de irreverentes jovens universitários vive a maior odisseia das suas vidas.

Todos os anos a academia da Universidade do Porto promovia um fim-de-semana radical na Serra da Estrela. Nesse ano para esquecer de 1991, um grupo de jovens aventureiros decide participar no que seria, mas ainda não sabiam, um dos piores dias das suas vidas. Parece a sinopse de um filme de terror de teenagers americanos, sinto muito, não é. Aconteceu.

Reza a história, que na montanha mais alta do país, são 1993 metros de altura de um colosso rochoso, os nossos intrépidos amigos iriam fazer escalada, rappel, slide e a tirolesa. Doce engano, à chegada naquela manhã fria de Março, o tempo ameaçava com chuva. Um nevoeiro denso que espreitava pelo dorso da montanha acabou por ditar à partida da cordilheira central para o transporte colectivo. Cada grupo seguiria o trilho acompanhado pelo respectivo guia até o autocarro que aguardava na berma da estrada. Partimos. O percurso que serpenteava pela montanha de repente deixava de ser tão nítido, com a súbita queda de neve. Seguimos em grande algazarra, extasiados pela queda de flocos brancos, tão raros de avistar abaixo destas altitudes, quando subitamente o guia estaca. Parece aturdido. Hesita e retrocede pelo mesmo trilho e perante a sua patente confusão, apercebemo-nos da nossa súbita nova realidade, estamos perdidos. O silêncio é gelado. Que ironia tão cruel. Ninguém ousa dize-lo, proferi-lo seria torna-lo real. Inevitavelmente acontece. Gritámos como é que é possível? Onde esta o mapa? A bússola? Foi apanhado desprevenido pela neve. Não trouxe. Nem sequer me lembrei de trazer. Como é possível? Não vale a pena lamentar-se mais. É necessário partir, o frio começa a afectar os membros, o grupo toma uma direcção aleatória.

A neve que caia levemente, lentamente se transforma num nevão, é preciso continuar. Não podemos parar. Devo dizer que não há nada mais assustador do que uma paisagem totalmente branca. O nosso sentido de orientação desaparece. Não há pontos de referência. Está tudo coberto por um manto de cor alba. O pânico instala-se silenciosamente. A visibilidade é nula. Só conseguimos avistar as marcas das nossas botas na neve, somos envolvidos por um denso nevoeiro. É urgente fazer alguma coisa, ou vamos perecer aqui transformados em cubos de gelo. Estacámos de novo perante o que parecer ser um penhasco. O grupo decide descer. Não há caminho. Pois bem, vamos abri-lo. Tanto quanto sabemos devemos estar a andar em círculos a já várias horas. A descida cautelosa começa. As nossas pernas afundam-se na neve, escorregámos e alguns deslizam alguns metros pela ravina. Nada de grave acontece. Continuámos a descer abrindo caminho pela vegetação rasteira que começa a aparecer. Á medida que a altitude diminui, a neve transforma-se em chuva, a terra transforma-se em lama. Seguimos munidos pela esperança que acalenta os nossos corpos cansados e pesados pela água que se condensa no nosso vestuário. Ouvem-se gritos de alegria. Alguém avistou um trilho. Ri-mos, saltamos e abraçamo-nos na chegada. É a civilização que se avizinha. Estamos salvos. Corremos pelo pequeno caminho em busca de algo, ou alguém e eis a estrada. Nunca fiquei tão feliz por ver alcatrão. Agora sim, o cansaço começa a tomar conta de todos. Tentámos avistar casas, mas nada. Estamos circundados pela paisagem serrana molhada. A chuva finalmente cedeu.

Ouvimos ao longe o barulho de um motor. É um automóvel! Acenámos e gritamos para que pare. O condutor em vez disso acelera.Da próxima ninguém escapa. Fazemos uma parede humana ao longo da estrada. No horizonte um novo veículo. Há uma súbita travagem. Explicamos a nossa situação e pedimos que pelo menos leve um dos membros do grupo até um telefone. Aí pela cara de susto dos ocupantes, apercebemo-nos que algo está mal. Questionámos o motivo de tal assombro. Parecem os abomináveis monstros da lama. Olhamos uns aos outros. Estamos cobertos de ervas e lama seca por todo o lado. Ninguém se tinha apercebido, a preocupação até ali era de sobreviver. Ouvem-se gargalhadas em uníssono! Pelo menos estamos inteiros. O condutor avisa-nos que há uma aldeia a poucos metros dali. Agradecemos e seguimos o nosso rumo. Caminhamos mais uma hora e finalmente avistámos os telhados de casas. Corremos buscando forças onde nunca imagina-mos possível. Há um café. IUPI! Parecemos uma manada de animais selvagem que entra de rompante pelo estabelecimento comercial, a dona quase morre de susto. Exigimos aos gritos bebidas quentes. Estamos cansados, sujos e gelados. Gera-se uma grande azáfama. Tempo de descansar, ganhar forças e sonhar com um banho. O desastrado guia, já contactou a sede. Desviámo-nos mais de 50 quilómetros do nosso destino inicial. Estavam todos á nosso espera no autocarro e como nunca mais voltamos já tinham contactado as autoridades. Não importa. Estamos sãos e salvos e é o que interessa.

A organização alerta para um novo contratempo. O nosso transporte colectivo não consegue chegar até nós. Há secções da estrada que foram cortadas por causa da neve. Ouvem-se uivos de desespero. Estamos fartos. Queremos descansar e tomar um banho, mas não por essa ordem. A solução aparece. Somos divididos pelas várias carrinhas em direcção a pousada. Bravo. Eu e os meus amigos saltamos de imediato para o jipe e exigimos ser aquecidos. Novo contratempo, a estrada mais curta para o abrigo está coberta de geada. O percurso alternativo significa contornar a montanha. Nem pensar! Arriscámos e vamos pelo acesso mais directo. Tudo corre bem até que o veículo na subida começa a deslizar em sentido contrário. Não há paciência! Uma ideia! E se a carrinha subisse com as portas abertas e fossemos entrando aos pares? Boa! Dito e feito! Fizemos isso mesmo! A cada 250 metros de estradas, o veículo estacava. Saímos todos. Voltava a arrancar e de dois a dois saltávamos para o interior. Todo um feito! Só para terminar, os outros que decidiram contornar a montanha chegaram mais cedo! Termina assim, a minha odisseia na montanha mais alta de Portugal. Para nunca mais!

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