Venha fazer uma viagem pelos aromas e paladares de um vinho único. Um néctar dos deuses amadurecido pelo homem.
A longevidade opera milagres no Vinho do Porto. Apura-lhe o estilo. Liberta-lhe novos aromas. Revela o seu esplendor. Descubram comigo o mundo fantástico do vinho generoso mais prestigiado do mundo. Uma viagem temperada de sabores divinos e majestosos. Única.
São 11 da manhã. O Porto avista-me do outro lado do Rio Douro. O seu olhar granítico, envolto pela espessa cortina de nevoeiro, deixa-me sempre emocionada. Estou em Vila Nova de Gaia, em frente a uma das Caves do Vinho do Porto.
«Bem-vindos à Taylor´s». A voz do simpático guia inunda o recinto de boa disposição. O cheiro da humidade espalha-se no ar.
«Em meados de Setembro começa a vindima na região do Alto Douro. Inicialmente realiza-se junto ao rio, uma vez que o solo é mais quente. Após três semanas atinge-se a vinha mais elevada (localizada a 1000 pés de altura). As uvas são posteriormente transportadas para a adega. Na Taylor´s, a maior parte das uvas é ainda pisada com os pés em lagares», explica. E prossegue: «Fortificado com aguardente de 77 graus antes de estar totalmente fermentado, o Vinho do Porto apresenta o dobro do grau alcoólico do vinho de mesa: de 19 a 22 graus. É naturalmente doce, já que o açúcar natural não se transforma completamente em álcool. Durante o envelhecimento, é criada a gama complexa e única que transforma esta bebida numa das mais famosas a nível mundial.»
Enquanto escuto as sábias palavras contemplo, fascinada, as grandes cubas. São utilizadas para produzir vinhos de estilos mais cheios como Late Bottled Vintage (LBV), Premium Reserve e Ruby. Os «cascos pequenos» - conhecidos por pipas - produzem os Tawny. Armazenado em cascos de carvalho, o Vinho do Porto «hiberna» durante o Inverno na adega aonde nasce. Anos depois, na Primavera, os cascos são transportados para as caves, em Vila Nova de Gaia.
O ambiente escuro e místico estimula a vontade de decifrar mais segredos sobre este néctar dos deuses. As explicações prosseguem. Existem distintos períodos e métodos de envelhecimento. Através deles, é criado um variado número de estilos de Porto: Branco Seco. Branco Doce. Tawny. Ruby. Colheita. Reserva. Late Bottled Vintage (LBV). Vintage. Este último é fruto de uma única colheita de qualidade superior. Engarrafado ainda jovem e rebelde, pode ser desfrutado imediamente. Contudo, diz quem sabe, as almas pacientes são recompensadas. Pronto a envelhecer durante anos ou décadas, o Porto Vintage maduro é uma exaltação ao sublime.
No paraíso
A visita termina após uma fantástica degustação de alguns exemplos de Porto. Com o sabor intenso do Tanwy a explodir na minha boca, dirijo-me para o exterior. Depois de comer um bacalhau com broa divinal num modesto restaurante ao pé do rio, ganho novo alento para prosseguir a minha «rota» do Vinho do Porto
O sol rompeu a cortina de nevoeiro e enche de alegria o início da tarde. Ao longe, avisto a Ribeira com a sua única cascata de casas (não é por acaso que ostenta o título de Património Mundial). E o Rio Douro, polvilhado de singulares barcos rabelos. Esta típica embarcação portuguesa passa a ter identidade desde 1792. De construção nórdica (tábuas sobrepostas, tábua trincada), transportava antigamente as pipas de Vinho do Porto desde o Alto Douro, aonde as vinhas se localizam, até às Caves, em Vila Nova de Gaia. Hoje é utilizado apenas como transporte fluvial, para gáudio dos muitos passageiros que com eles «dançam» nas águas calmas.
As características incomparáveis do Vinho do Porto não são apenas fruto da sua vinificação. Tal como os restantes grandes vinhos mundiais, dependem igualmente de uma conjunção invulgar de factores: Solo, clima e casta. Enquanto contemplo o rio que se espreguiça no horizonte, a imagem do berço do Vinho do Porto - a Região do Douro – surge dentro de mim. O vale encantado. A paisagem teatral. O solo de xisto. Os impressionantes socalcos feitos por mão humana nas íngremes encostas. Os ventos húmidos soprados pelo Atlântico. Os invernos rigorosos. Os secos verões solarengos. As férteis vinhas com a sua multiplicidade de castas. Primeira Região Demarcada do mundo, é considerada Património Mundial. Sem dúvida, um epíteto justo.
O soprar do vento varre subitamente as minhas memórias. Com determinação, caminho a passos largos pela Cidade Invicta. Através dos caminhos do Romântico, chego ao Palácio de Cristal e aos seus espaços verdes encantadores. Mais à frente, deparo-me com a Quinta da Macieirinha, aonde se encontra o Museu Romântico - o magnífico jardim e a bela casa do Século XIX. Na parte traseira, depois do jardim das rosas, situa-se o Solar do Vinho do Porto. O fresco aroma das flores impregna de magia este local deslumbrante. Comovida, contemplo a vista sobre o Porto e o Douro, emoldurados pela Ponte de Arrábida.
A tarde envelhece lentamente. Sem demoras, sento-me num dos confortáveis sofás do bar e olho atentamente para a ementa. As possibilidade são infindáveis - existem centenas de tipos e marcas de Vinhos do Porto. Embora o preço seja mais elevado do que os meus padrões habituais, aceito a sugestão do afável funcionário: Um Vintage maduro da Graham's. O aroma superiormente elegante leva-me a uma nova dimensão sensorial. Quando descubro o seu sabor distinto, deixo, por momentos, a vida terrena. Um pedaço de paraíso apodera-se da minha boca. E da minha alma. Este vinho é uma obra-prima. A natureza criou-o. A maturidade revelou-o. O nosso grande Fernando Pessoa salientou uma vez: «Boa é a vida, mas melhor é o vinho». Eu acrescento: O Vinho do Porto. De preferência, Vintage.